13º dia – do rio Essequibo a Lethem

O esforço do dia anterior para manter a moto nos trilhos da difícil estrada entre Linden e Lethem cobrava seu preço. Mesmo tendo dormido pesado por várias horas, acordei com dores nos braços e pernas e meu joelho esquerdo, que mais sente quando eu faço um grande esforço, também estava dolorido.

A casa onde estava hospedado acordou cedo, com choro de criança e conversas. Ainda estava escuro lá fora e também dentro. O gerador estava desligado. Alguns minutos depois ele foi ligado, a casa iluminou e o ruído aumentou. Levantei, arrumei as coisas, vesti a roupa e coloquei o baú próximo à janela para poder pegar do outro lado, onde a moto estava.

Do lado de fora havia uma van e uma pickup estacionadas e várias pessoas espalhadas pelo pátio. Creio que chegaram durante a noite e eu não escutei. Dormiram em redes penduradas nas colunas que sustentam o telhado de palha de grandes quiosques. Seguiam para Lethem. Coloquei a moto sobre o cavalete, lubrifiquei a corrente, coloquei o baú e levei a moto para a frente da casa.

Um brasileiro entre os passageiros da van veio conversar. Era garimpeiro e morava na Guiana há 13 anos. Disse que não voltaria mais para o Brasil. Perguntei se ele sabia do estado da estrada até Lethem e ele disse que estava pior que o trecho anterior. Como? pode ser pior? Dei a ele um adesivo e fui despedir do pessoal da casa. A Senhora mais velha pediu desculpas pelo barulho, justificando que o neto não estava bem. Falei que não tinha problemas, já estava acordado quando ele começou a chorar.

Viagem de moto Guiana

A pickup saiu. Fui para moto e a filha da Senhora veio perguntar se queria o café. Agradeci justirficando que tinha que pegar a balsa. Tinha que aproveitar os dois veículos indo na mesma direção, pois a balsa só atravessa o rio quando tem carros. Motos não pagam e por isso não justificam a travessia.

Liguei a moto e segui pela estrada em direção ao lugar do embarque. A pickup estava subindo a rampa. Esperei ela parar e segui atrás, equilibrando na tábua que leva à rampa. Estacionei e logo a van chegou. Teve problema ao passar pelas tábuas e atolou. Liberada pouco depois.

Uma senhora que estava na van veio perguntar se umas moças poderiam tirar fotos com a moto. Deixei e foi uma procissão.

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Do outro lado, segui até uma cancela onde havia um posto de checagem da polícia e uma alfândega. Não entendi alfândega no meio da floresta. Tinha que passar na alfândega para registrarem em um caderno os dados da moto e depois na polícia para fazerem o mesmo. Não houve pedido de dinheiro para drink.

O trecho inicial, com cerca de 60 km, que cortava a floresta, estava excelente. Parecia preparado para asfaltamento. Tinha máquinas trabalhando no nivelamento e, mesmo em obras, consegui fazer esse trecho inicial em pouco mais de uma hora.

Depois acabou a floresta, iniciou a savana e a estrada mudou também para um piso de cascalho claro cheio de buracos secos e pedras do tamanho de tijolos espalhadas por todos os lados. Um horror. 10, 20 km/h no máximo. Exigiu muito da moto e de mim. As bancadas doíam direto no coração.

Viagem de moto Guiana

Fazia muito calor. Nenhuma sombra para uma parada para descanso. Vacas, cabritos e pessoas começaram a aparecer caminhando pela estrada. O isolamento da floresta ficou para trás, fazendas e vilas começaram a aparecer aqui e ali. Tudo muito rústico e sem tecnologia.

Cheguei a Annai. Tinha planejado abastecer naquela vila, mas o posto de gasolina não estava no local indicado pelo mapa. Fui olhando cada local até parar em uma lanchonete com a bandeira do Brasil pendurada na fachada. Perguntei a uma moça onde havia um posto de gasolina e ela respondeu em português que havia um posto logo à frente.

Estava meio escondido, mas ahei o posto. Pedi para completar e o valor deu maior do que os dólares guianenses que eu tinha no bolso. Perguntei se aceitava reais e ele confirmou. Perguntei quanto e disse em torno de R$ 15,00. Dei uma nota de R# 20 e disse que podia ficar com o troco. Depois fiz as contas e dava no máximo R$ 5,00.

A estrada continuou muito ruim por quase 50 km. Devo ter gasto quase 3 horas para fazer esse trecho. Sem sombras para parar para descansar e beber água.

Passei por um carro com placa do Brasil. Fiz sinal e pararam. Perguntei como estava a estrada à frente e o motorista disse que 5 km à frente virava um tapete. E foi mesmo, excelente, mantive os 70 km/h, mas podia andar a mais de 100 tranquilamente. Mas o risco de uma escorregada era grande.

Viagem de moto Guiana

Cheguei a Lethem. Parecida com as cidades longínquas de fronteira, muito feia. Vários carros com placas do Brasil transitando. O GPS me mandou para um caminho errado e tive que voltar. Perguntei em um posto e me indicaram o caminho certo.

Cheguei à aduana por volta das 15h. Os carros passavam tranquilamente sem parar. Parei para registrar a saída.

Finalmente estava no Brasil. consegui completar a fase mais complicada da viagem em relação à língua, cultura e estradas.

Passei pelo prédio da polícia federal e um senhor fez sinal para que eu seguisse em frente. Peguei uma estrada novíssima em direção a Boa Vista. Uma beleza. Cheguei rápido à cidade e fui procurar o hotel que tinha na minha lista. Não consegui encontrar, então parei em um posto de gasolina, abasteci e perguntei para um frentista sobre um hotel. Ele disse que tinha um há poucas quadras dali. Segui para ele, onde fiquei hospedado.

Mais tarde um motociclista da cidade com quem vinha mantendo contato foi me buscar para mostrar Boa Vista. O Jean Brustolin, Brutus, é profgessor e autor de livro de viagem de moto. Depois fomos tomar uma cerveja e comer um sanduíche em um quiosque na avenida central da cidade.

Resolvi ficar em Boa Vista um dia para descansar e fazer uma revisão na moto, mesmo não estando na quilometragem indicada. Achei melhor garantir que ela estivesse em perfeitas condições para me levar para a próxima etapa da minha viagem. 


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