24º dia – de Ciudad Guayana a Boa Vista

Um detalhe que não comentei é que o desayuno na Venezuela é um prato feito, normalmente composto por uma carne, fatias de queijo e presunto, ovos mexidos e pão. No hotel que eu estava seguia esta tradição, deixando sobre uma mesa para self service, frutas e sucos.

Depois do desjejum e de levar a bagagem para a moto, iniciei a viagem em direção ao Brasil. Tinha mais de 850 km para chegar a Boa Vista, o meu objetivo do dia. Não sabia se conseguiria, tendo em vista as condições das estradas que passaria, a provável dificuldade para abastecimento de gasolina e a passagem pela fronteira.

Inicialmente a estrada era muito boa, uma auto pista duplicada, com alguns buracos aqui e ali que não dificultavam o deslocamento, por isso consegui percorrer uma distância boa em pouco tempo até chegar às estradas simples. Deste ponto em diante, além da quantidade de buracos aumentarem, o número de veículos também aumentou, me obrigando a reduzir a velocidade e negociar constantemente as ultrapassagens.

{loadmodule mod_custom,Anúncios Google Artigos}

Os problemas com abastecimento de gasolina também vieram. Nenhum posto que passei tinha gasolina, de modo que tive que comprar clandestina. Em cada lugar, um valor.

O primeiro que encontrei foi em Pueblo Cintillo. Um rapaz me vendeu 5 litros por 100 soberanos, aproximadamente R$ 7.

A água subiu de preço desde que comecei a viajar pelo país. Cheguei a comprar uma garrafa de 1,5 litros por 50 soberanos. Agora não encontrava por menos de 150 soberanos. Resultado da hiperinflação na nova moeda que o governo acabou de lançar.

Em uma região de florestas, passei por vários trechos da estrada em que as árvores formavam túneis. Na vinda também passei pelo lugar e achei muito bonito, mas depois detestei o lugar. As sombras entremeadas pela luz do sol escondem buracos no asfalto e caí em vários deles. Ainda bem que sem consequências, mas passei vários sustos.

Em uma manifestação pela qual passei, a estrada estava bloqueada com objetivos, galhos e pedras. Fui passar por um canto e umas mulheres manifestantes gritaram que havia vidros quebrados no lugar, sinalizando para não prosseguir. Uma delas foi até alguns objetos e retirou, sinalizando para eu passar com segurança.

Depois de El Callao eu passei por uma barraca à beira da estrada onde havia um tambor azul. Parei para ver se tinham gasolina e a mulher que estava lá disse que sim. Chamou um cara e ele trouxe uma garrafa de 2 litros, pelos quais paguei 50 soberanos.

Mais à frente consegui mais 4 litros por 200 soberanos. Esses 11 litros não eram suficientes para chegar a Boa Vista. No território brasileiro, não existem postos desde a fronteira até a capital de Roraima, numa distância de mais de 200 km, então tinha que abastecer na Venezuela.

Viagem de moto pela Venezuela

Quando cheguei à Gran Sabana e parei em uma placa para tirar fotos. Pouco depois chegou um carro com uma família dentro e uma senhora disse que estavam me acompanhando há algum tempo. Conversamos e eles pediram para tirar fotos com a moto.

Segui viagem parando para tirar fotos de montanhas, rios e cachoeiras que apareciam à beira da estrada.

Parei em um restaurante e encontrei novamente a família. Perguntei para o motorista, o Michael Rodrigues, se havia gasolina ali para vender. Ele perguntou quanto eu precisava e falei que em torno de 4 litros. Ele disse que me cederia a gasolina que eu precisava. Ele levava três reservatórios de combustível no teto do carro. Tirou um deles e com uma mangueira completou o tanque da moto. Acho que foram mais de 5 litros. Perguntei quanto era e ele respondeu que não iria me cobrar, completando que “nem todo venezuelano é gente má”. Com certeza!!! Assim como o Michael, durante minha viagem encontrei muitas pessoas boas na Venezuela. Quando parava para beber água ou descansar, várias pessoas que passavam com carros paravam e me perguntavam se precisava de ajuda.

A insegurança que sentia ao viajar pelo país me foi passada exclusivamente por brasileiros nas redes sociais, que me chamaram de louco por entrar na Venezuela, relatando problemas que não encontrei nos lugares que conheci. Os próprios venezuelanos também manifestaram preocupação comigo, repetindo que determinada região era perigosa, que não deveria parar em qualquer lugar e não deveria viajar à noite de forma alguma. Em nenhum momento me senti ameaçado. É claro que acabei seguindo a recomendação de não viajar à noite, mas parei em vários lugares ermos, caminhei pelas ruas de Caracas e de pequenas cidades, de dia e à noite, sem qualquer contratempo. Talvez por sorte, talvez não. Saí do país com a sensação de que há um exagero neste aspecto.

Peguei uma chuva forte na Gran Sabana, que baixou a temperatura e me fez sentir frio pela primeira vez depois de muitos dias de viagem.

Viagem de moto pela Venezuela

Cheguei a Santa Helena e lá havia um posto com gasolina, mas a fila travou o trânsito da cidade. Não valia a pena tentar abastecer, perderia muitas horas, pensei. A gasolina que tinha no tanque era suficiente para chegar na reserva a Boa Vista, desde que não acelerasse muito forte. Resolvi tentar encontrar um pouco clandestina para maior segurança. Parei em uma oficina, perguntei e me indicaram uma lanchonete próxima onde havia uma moto estacionada na porta. Fui lá e o rapaz me vendeu 4 litros por R$ 10. Ele tirou a gasolina da própria moto e fez questão de receber em reais. “Soberanos não valem nada.”

Passei na imigração, fiz os procedimentos para saída do país, mas a aduana estava fechada. Só funcionava até às 15 horas. Não voltaria de forma alguma no dia seguinte. Segui em frente. Passei na Polícia Federal e carimbei o retorno ao Brasil.

Tinha 215 km pela frente, pouco mais de 50 dos quais muito ruins e um trecho em obras que é de terra. Pelas minhas contas, conseguiria passar pelo trecho ruim durante o dia e o restante à noite. Foi o que ocorreu. Depois do trecho ruim a estrada está excelente e cheguei a Boa Vista às 20 horas, tendo percorrido 857 km. Parei em um Ibis na entrada da cidade e mais tarde jantei uma picanha num restaurante do shopping ao lado.

{gallery}1018/america/04{/gallery}


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *