Viagem de moto pelo Peru

8º dia – Puerto Maldonado – Quinzemil

Viagem de moto pelo Peru

Saímos de Porto Maldonado, um lugar empoeirado e infestado de moto táxi, veículos velhos e um povo completamente indecifrável. Não sabíamos se eram índios, ou se eram feios mesmo. Saímos e o transito louco nos acompanhava.

Moacyr, com o GPS, ia na frente, quando ele parou repentinamente num semáforo. Kadinho que vinha atrás desviou e Rodrigo que vinha em seguida bateu na traseira da moto do Moacyr caindo e quebrando novamente a mesma pedaleira que havia quebrado na queda em Rio Branco. E agora? Onde iríamos conseguir soldar uma pedaleira de alumínio num lugar daqueles??? Paramos todos novamente numa sombra. Barbieri e Moacyr pegaram a moto de Rodrigo e desmontaram a pedaleira.

Ficamos ali vendo qual a solução e Barbieri foi em direção a uma oficina, explicou ao proprietário o problema, pediu as ferramentas do mecânico e pôs-se a soldar um pedaço de cano com uma chapa e fez duas pedaleiras, pois do jeito que estavam caindo, uma reserva iria bem. Enquanto Barbieri fazia a pedaleira da moto do Rodrigo, Moacyr foi numa loja e comprou um pneu de cross muito irado, com gomos de borracha enormes para enfrentar a estrada em obras. E eu e Paulo com pneu esportivo, somente nos sobrava a opção de torcer e rezar para não sofrermos muito.

As motos ficaram na calçada e durante quase 2 horas aproximadamente ficamos ali conversando e bebendo refrigerante. Nisso começaram a chegar os curiosos moradores do local, querendo ver as nossas motos e conversar com a gente. Vieram duas pessoas da TV local nos entrevistar e tirar fotos. Não conseguimos passar pela cidade sem causar espanto e curiosidade e quando menos esperávamos, estávamos cercados por mais de 50 pessoas com seus motos táxi, bicicletas e a pé vendo nossas motos e conversando com a gente. Foi muito divertido ver as expressões dos rostos deles quando tocavam em nossas motos. As perguntas começavam por quanto custa? Corre quanto? E assim por diante.

Paulo deu duas entrevistas à TV local que não cansava de fazer perguntas das mais diversas possíveis.

Pedaleira feita, colocada na moto do Rodrigo, era hora de irmos adiante.

A estrada que tínhamos pela frente parecia que tinha sido lavada de tão bem conservada e super novinha. Uma maravilha. As curvas eram fortes, com trechos de precipícios e encostas perigosas. Tocamos com cuidado e prudência. Paramos para comprar folha de coca para mascarmos devido a altitude que iríamos enfrentar, que era em torno de 5.000 metros sobre o nível do mar e mascar folha de coca era a única opção. A outra opção era torcer para ninguém passar o mal da altitude.

O asfalto novo acabou e chegou o pesadelo das motos. Estrada em obras, buracos, pedras, saibro, areia, caminhões passando por nós como se não existíssemos na pista. Eram 3 horas local, e 5 horas no Brasil. Até aí tudo estava sob controle, ou seja, estava ruim mas controlado. Chegamos a uma situação daquelas com uma pessoa com uma placa de PARE E SIGA. Paramos todos.

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Perguntamos quantos minutos iríamos ficar parados pois estava chovendo. A resposta foi: minutos não. Vão ficar parados aqui por 3 horas. Pois a estrada está em obras e somente será aberta às 6h da tarde….Não estávamos acreditando naquilo. Falamos que estávamos viajando de moto, e que daria para passarmos sem atrapalhar os caminhões e se saíssemos às 6 horas iríamos viajar a noite e que era perigoso. Foi a mesma coisa que não falar nada. Barbieri foi a pé depois da placa de PARE para ver se falava com alguém da Odebrecht, mas foi em vão. Paramos as motos e a fila de carros e caminhões foram se formando atrás, formando um bloco de esperançosos. Fomos para uma tapagem, tipo um barracão que se encontrava as margens da estrada e ali ficamos. Dormimos, conversamos, olhamos para o nada. Vimos aquela gente que vivia e sobrevivia daquela situação vendendo bananas, água e todas as coisas que podem oferecer para sobreviver.

O tempo parecia não passar e as horas paradas naquele lugar pareciam não acabar. Ficamos conversando ao redor de uma grande mesa que havia sob o galpão até que a fome apertou e para quem não tinha almoçado, somente comido biscoitos e bananas, um prato de arroz e feijão seria uma maravilha. Vimos uma casa próximo de onde estávamos e pedimos a dona da casa se ela poderia cozinhar um almoço para nós e ela prontamente disse sim. Também pudera, seria uma ótima oportunidade de ganhar um dinheiro. Não demorou muito e veio de suas mãos 8 pratos de arroz, feijão, bife, ovos e salada. Comemos feito loucos e matamos por completo a necessidade de uma comida caseira e bem caprichada.

E o tempo piorava. Chovia cada vez mais e olhávamos para a mulher que tinha a placa de PARE nas mãos e pedíamos a todo instante para podermos passar e sempre ouvíamos a mesma resposta: NÃO. Enfim, 6 horas e nos colocamos a postos e saímos para o desconhecido e misterioso trajeto em obras.

A lama, o rípio, as pedras enormes e os caminhões que estavam trabalhando no período da tarde retornavam e outros iam para o acampamento da Odebrecht, ocupando a pista toda e tínhamos que desviar e procurar caminhos alternativos para não cairmos na frente ou atrás deles. Nas curvas acentuadas da estrada em obras era o mistério dos mistérios. Se encontrássemos um caminhão neste cotovelo de estrada era um problema a ser resolvido. Os caminhões faziam a curva estreita e não havia em muitos trechos lugar nem para a moto esperar. E assim dividimos o improvável com o impossível. Muitas situações de risco e perigo iminente foram vencidas com experiência e cuidados extremos por todos nós, mas não impediu que houvesse quedas de alguns amigos, porém sem gravidade, apenas moto na lama, na areia com baús ao chão e nada mais grave que sujeira e levantamento de moto no braço.

Moacyr, pela experiência em MotoCross e por estar com um pneu completamente apropriado, fazia a conferencia das necessidades de cada um que estava naquela situação. Ora ele passava por nós, ora ele voltava passando por nós, verificando se alguém precisava de ajuda para atravessar os piores trechos ou se alguém havia caído e precisava de ajuda para levantar a moto da lama.

Numa curva muito acentuada, eu com minha moto de pneus lisos, no maior cuidado, vi Moacyr passar por mim e se defrontar com um dos caminhões que voltava, e ele com sua pericia e senso de defesa, desviou para a direita, saindo da frente do caminhão, contornou saindo da pista e passou pelo imprevisto com habilidade e experiência. Vi tudo aquilo na minha frente, no final da luz do dia que já estava acabando e fiquei impressionado com a manobra brilhante feita pelo amigo.

E tocamos em frente. A noite chegou e ficamos pensando o que seria da gente nos próximos 100 km até chegarmos à próxima cidade que nos esperava debaixo de muita chuva, frio e lama. O relógio marcou 10 horas da noite e chegamos ao lugar chamado Quinzemil. Um nome estranho para um lugar, mas como tudo aqui é meio louco, uma cidade com este nome deveria ter seus motivos.

Chegamos com a gasolina no fim por termos que usar as motos em baixa rotação e acelerando para controlar a velocidade no trecho com areia, lama, rípio e pedras soltas.

Tinha uma venda de doces e produtos na frente do hotel que iríamos ficar e abastecemos as motos ali mesmo, com galões sujos e um pano para filtrar a gasolina dentro de um funil também imundo. Parei, abasteci minha moto com o Odileno e fomos para o Hotel.

Chegando na garagem percebi que havia esquecido minha luva na soleira da venda onde tinha abastecido minha moto. Voltei e perguntei se não tinha deixado minha luva ali e um garoto com jeito de muito esperto me falou que tinha sim e já tinha guardado a luva dentro de uma caixa. Eu pensei, ele deveria ter me chamado, já que estava do outro lado da rua e me entregue as luvas. Mas pensei, porque ele faria isso se as luvas seria um grande troféu para ele como recordação de um grupo de motoqueiros que passou ali. Deixei de lado, pois o que importava naquele momento era minha luva, apesar de imunda e molhada.

Fomos para o Hotel. Chegando no lugar, guardamos as motos no espaço que havia e subimos. O responsável pelo hotel, era um irmão do Corcunda de Notre Dame misturado com uma cara de infeliz e coitado. Ele nos apresentou os quartos que mais pareciam cocheiras ou coisa parecida, cheio de remendos, emendas de madeirite, compensados, pedaços de tabuas, cada quarto com três camas que olhando bem, pareciam outra coisa. Barbieri eu e Paulo ficamos no mesmo quarto. Barbieri nem levantou as cobertas. Deitou por cima do que existia ali com as roupas que estava usando na viagem, tirando apenas a bota e o capacete. Eu peguei uma camiseta e coloquei o travesseiro dentro dela para ao menos não respirar poeira ou qualquer outra coisa que poderia ter na fronha.

No outro quarto viram um rato do tamanho de um gato deitado confortavelmente numa das camas e com a nossa chegada fugiu num enorme buraco da parede. E isso foi o que conseguimos ver. Imagina o que não vimos antes de chegar nos quartos?

Eu, Moacyr, Odileno e Paulo saímos para ver se achávamos comida naquele lugar. A chuva aumentava a cada minuto que passava. E o pior de tudo é que sabíamos que teríamos que acordar as 4 horas da madrugada para podermos passar antes das 6 horas na próxima tranqueira com bandeira de PARE E SIGA.

Chegamos em frente ao hotel num lugar que não sabíamos se era um restaurante, um bar, uma zona ou outra coisa. Entramos, pedimos o que tinha para se comer e nos foi servido um frango inteiro dividido em 4 pedaços, batata frita e tomate. O frango frio, já sem muita aparência, foi devorado por nós quatro sem piedade, pois a fome e a fraqueza eram presentes em nossos corpos cansados. Comemos e fomos deitar, pois dormir seria quase impossível.

O banheiro coletivo e de chuveiro de água fria foi usado por poucos corajosos do grupo, incluindo eu, claro.

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