EU NÃO POSSO!!!

Um grupo de motociclistas, que também eram ótimos patinadores, após terem inaugurado rinque de patinação (a convite do Prefeito) construído na várzea, em Teresópolis, vez por outra iam lá para fazerem algumas apresentações, incrementando assim o esporte no bairro.

Isso aconteceu nos anos 50… Tem pouco tempo, não???

Por estar ainda em construção a estrada Rio-Teresópolis, que depois integrou-se à BR-116, íamos pela antiga estrada “União Indústria”, que passava por Petrópolis, Correias e Itaipava. Estrada bem sinuosa, com bom piso, exatamente como motociclistas gostam, e ainda toda florida com hortências.

Nesse dia de domingo, porém, tendo sofrido acidente com minha moto, um outro companheiro com a dele e, não havendo jeito de consertá-las por necessitar de ferramentas e até de equipamento de que não dispúnhamos, elas tiveram de ficar na cidade para serem levadas para a oficina no dia seguinte.

E por não haver lugar nas garupas das outras motos, tivemos que comprar passagens de ônibus para viajarmos à noite. Os companheiros partiram com as motos no início da noite e nós, no ônibus, no final dela.

Enquanto esperávamos a hora da partida do ônibus e pelo fato de que não íamos pilotar, ficamos bebendo algumas cervejas no bar bem em frente ao ponto de embarque.

Hora da partida, o motorista buzina para avisar que já ia sair. Então, eu, o meu garupa Fernando e o piloto da outra moto (que tinha apelido de Pinduca, talvez por ser baixinho e bem magro) nos levantamos para embarcar.

Aconteceu que, exatamente nessa hora, o Pinduca levanta da mesa e diz que queria ir ao banheiro para urinar, pois bebera muita cerveja. Dissemos ser impossível, tendo em vista que o ônibus já estava lotado, de saída, e era o último daquele dia.

Imediatamente entramos no ônibus e nos sentamos em bancos separados por estarem os outros ocupados.

Eu fiquei sentado bem atrás de onde sentara o Pinduca e, por ser ele miúdo, eu só via os seus cabelos por cima do encosto.

Não demorou muito, ele vira-se para trás e diz:”João, Estou muito apertado!” Mediante tal situação eu respondi que já chegaríamos em Petrópolis e que fosse se aguentando.

Mais um pouco, volta-se ele outra vez e pede que eu peça ao motorista para parar na estrada a fim de que ele vá lá fora porque já não agüentava mais. Respondo ser isso perigoso, por ser noite, não haver acostamento e a estrada estar totalmente escura.

Parecendo ter compreendido a situação, calou-se, e também não mais vi seus cabelos por sobre o encosto do banco. Chegando em Petrópolis, onde seria feita uma parada demorada para necessidades e refeições ligeiras, os passageiros vão saindo, nós também (eu e o Fernando) e ao passarmos pelo banco do Pinduca, que estava com cabeça e mãos encostadas nos joelhos, impedindo a saída do passageiro do canto ao seu lado.

Vendo isso chamei-o várias vezes para que levantasse mas manteve-se calado e inerte tal como estivesse desfalecido, até que, finalmente, na mesma posição, com voz rouca e sofrida, diz:

EU NÃO POSSO!!!

Em seguida, eu e o Fernando, segurado-o por suas axilas, o tiramos do banco encolhido como estava, e o conduzimos pelo alto até ao banheiro, onde ficou sozinho resolvendo seu problema.

Passado algum tempo aparece ele sorrindo, chega junto ao balcão e pede uma cerveja. O que imediatamente contestamos dizendo que ele não beberia mais nada até chegarmos ao Rio.

Talvez tenha sido por situações assim que foi criada por “pinguços” a expressão: “Pô… parece que bebe???”

*João Cruz é autor do livro Motociclistas Invencíveis.


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