Recife, 15/03/1960. Dia do retorno ao Rio

Uma verdade ficou bem clara: se para eles a viagem do Rio de Janeiro até Recife e Campina Grande castigou-os bastante e acharam ter sido extremamente dura, se compará-la com o que aconteceu no retorno ao Rio de Janeiro, a viagem que fizeram de ida pode ser considerada como passeio no paraíso.

Continuando, numa pequena amostragem da odisseia que passariam em todo retorno, logo de início o dia amanheceu nublado e chuvoso, mostrando-lhes o que iriam enfrentar dali por diante.

Saíram com algum dinheiro (dinheiro através de Banco nem queriam saber, por que não sabiam quando nem por onde estariam nesse retorno com chuvas); um saco plástico contendo galinha assada e farofa; outro com carne de sol também assada e farofa, tudo dentro do bornal que Fernando levava a tiracolo.

Isso iria alimentá-los possivelmente por uns 2 ou 3 dias.

Primeiro comeriam a galinha com farofa por estragar mais rápido, depois a carne de sol, por resistir mais tempo.

Agora que estão partindo, o céu continua nublado, porém não está chovendo. O que é muito bom!

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Despedindo-se do pessoal, o piloto disse para a Zezé que a encontrará no Rio logo que eles lá chegassem (encontros que duraram por um bom e longo tempo), isso porque, voltando de avião, mesmo saindo dias depois, ela chegaria antes deles ao Rio.

Partiram pegando estrada molhada, mas como o piso nesse trecho era asfaltado, por enquanto, para começar, estava muito bom. Após longa subida chegaram a Jaboatão dos Guararapes, onde dessa vez pagaram o pedágio apanhando o talão para entregarem-no em Vitória de Santo Antão. Maravilha! Tudo bonitinho.

Acabando o asfalto e agora em estrada de terra, passando pela cidade de Gravatá, que fica na subida da Serra da Russa, aconteceu de furar novamente o pneu que estava com câmara de ar nova. Câmara que havia sido comprada na ida em Caratinga (MG), agora velha devido aos muitos furos que teve quando estava no antigo pneu cortado.

Após fazerem rapidamente o conserto (já estavam acostumados) e estando bem próximos a Caruaru, encontram um impedimento na estrada onde havia placa informando para pegarem uma estradinha lateral em direção a Bom Jardim, o que fizeram.

Aconteceu que essa estrada de terra ia dar em nada, talvez porque tivessem errado o caminho devido à chuva que caía forte há bastante tempo. Diante disso, resolveram retornar e, vendo haver outro caminho, seguiram por ele. Mas, devido a alguma distração do piloto, aconteceu de mais adiante a moto ficar presa num enorme atoleiro. Atolou tanto que saíram de cima dela e ela ficou em pé, sozinha, no mesmo lugar. Era uma situação desagradável, porém tiveram de rir do inusitado. Quase metade das rodas entrou no barro, inclusive o cárter que foi a base para ela ficar em pé sozinha. Por um momento ficaram olhando para ver o que poderiam fazer a fim de desatolá-la. Enquanto isso uma terrível chuva caía fragorosamente.

A extensão do atoleiro à frente era enorme. Mesmo se a desatolassem de onde estava não poderia ir adiante porque o atoleiro continuava. Os sapatos e parte das calças eram só lama. Os sapatos que haviam ficado dentro do lamaçal retiraram-nos limparam e os guardaram nas maletas laterais. Pensando numa solução para tirar a moto dali, concluíram que o único recurso seria fazerem um caminho com galhos das pequenas árvores que havia na beira da estrada. E foi o que fizeram!

Primeiro cortaram com o facão (haviam levado) os galhos das árvores (eram galhos finos e com folhagem); a seguir cortaram-nos em tamanhos que dessem para as rodas passarem por cima com segurança e também suportarem o peso da moto; calcularam um pequeno espaço entre cada um deles, o suficiente para evitar que a roda afastasse um do outro; finalmente, junto com as folhagens colocaram-nos atravessados na frente e em toda a extensão do atoleiro, começando junto da roda dianteira e indo até ao fim do atoleiro.

Pronta a trilha, o próximo passo era desatolá-la. Após liberarem-na, eles então a empurraram para cima da trilha feita com os gravetos.

Chegando ao final da trilha e já fora do atoleiro, montaram na moto e seguiram em frente. Mas antes disso terminaram de limpar os sapatos, as meias e também o grosso da lama das mãos e dos pés nas poças da água da chuva. Nessa brincadeira perderam cerca de meia-hora.

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Ao chegarem novamente à estrada principal, um pouco antes do local chamado Mimoso, o que foi que aconteceu? A gasolina acabou.

Da última vez que a torneirinha do cano reserva fora aberta, o piloto esqueceu de fechá-la. Aí deu no que deu. A gasolina acabou sem avisar quando chegou à reserva.

Não pediram gasolina a ninguém porque os poucos caminhões que passavam pela estrada não queriam parar com receio de atolar e além do mais não iriam gostar de tirar gasolina debaixo de tanta chuva. Mediante tal situação e não havendo posto de gasolina próximo (o que era normal), após algum tempo de espera Fernando conseguiu arranjar carona num FNM (andam devagar) para ir adiante até a cidade de Arcoverde, distante 8/10 km de onde estavam a fim de pegar gasolina.

Por sua vez o piloto ficou na beira da estrada esperando-o voltar.

Por estar parado, começou a sentir frio e o pior é que caía chuva grossa. Não tendo onde se proteger apanhou o oleado que cobria as maletas de roupas e com ele se cobriu, sentado no banco da moto.

Já era quase noite quando Fernando voltou de carona com a gasolina. Além do Posto ficar muito longe havia a dificuldade do trânsito de veículos pela estrada cheia de atoleiros, sem falar do temporal que castigava bastante.

Após abastecer o tanque foram obrigados andar à noite debaixo de chuva forte e sem farol, até a cidade de Arcoverde, aonde chegaram por volta das 19h e nela pernoitaram. Se perguntassem aonde foi que dormiram não saberiam dizer, tão exaustos estavam.

Devido à hora, à chuva e ao frio que fazia, inclusive por causa de atoleiros, o trânsito na estrada era bem fraco, razão de quase não haver viva alma no caminho que percorreram.

Motociclistas Invencíveis

Semanalmente vamos publicar, aqui no Viagem de Moto, capítulos do livro Motociclistas Invencíveis, romance extraído de uma viagem com moto ocorrida em 1960.

Conduzindo na garupa da moto um amigo, piloto sai do Rio de Janeiro por estradas de terra a fim de encontrar sua linda namorada, que saindo de Itabuna (BA) para morar no Rio de Janeiro, de repente, da noite para o dia, desaparece sem deixar rastros. Chegando a Itabuna, o piloto descobre que ela fugia de assassinos (contratados para matá-la), pelo fato dela ser testemunha do assassinato de seu pai, ex-cacaueiro na região.

Por acontecerem muitas aventuras e novos amores pelo caminho, foram até a Paraíba.

Enfrentaram sol, poeira, chuva e lama. Ajudaram, foram ajudados, acontecendo inclusive que, por levarem uma garota (estava num leito de morte) entre eles dois até ao hospital, salvaram sua vida. Em si, a história mostra como eram os motociclistas Nos Deliciosos Anos Dourados.


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