Ilhéus (BA)

Eram 8h de uma manhã tão agradável que os fez acordar bem dispostos. Mas muito surpresos ficaram quando viram estar juntos de algumas moças, que embora não sendo nenhuma “Brastemp”, também “não eram de se jogar fora”.

E o curioso é que estavam todos completamente à vontade. Eles dois e elas também, que eram várias. Nisso, ambos pensaram: “Será que acordamos num harém ou até no Paraíso?”

Retroagindo seus pensamentos, piloto lembrou terem visto algumas delas, à noite, em um muro na beira da praia quando eles estavam olhando o mar. Fernando reconhecendo uma delas (à tarde vendia acarajés na praia, enquanto o piloto cochilava e teve o sonho) apresentou-a e ficaram todos conversando. Tarde da noite foram todos para um barzinho bem modesto, onde demoraram “jogando conversa fora” e também bebendo. Elas beberam água de coco e os dois, cerveja acompanhada do “aperitivo” feito pelo “barman”. Por terem bebido bastante enquanto conversavam no bar e aliando-se a isso o cansaço do dia, dessa noite só tiveram essa vaga lembrança porque, quando foram convidados para irem a casa delas já estavam “mais pro jacaré que pro beija-flor”. Então, o que houve e se realmente houve no rigor da noite, não saberiam dizer.

Após acordarem na manhã seguinte, sem terem ideia do que realmente acontecera, tomaram junto com elas um delicioso café da manhã, o qual já se encontrava preparado e servido.

A título de brincadeira e não querendo que os dois partissem, elas tinham escondido as roupas deles e a motocicleta enquanto dormiam, mas tudo ficaria acertado mediante um “acordo” proposto por duas das moças mais empolgadas, estabelecendo o seguinte:

Se eles cumprissem o tal “acordo” elas devolveriam as roupas e diriam onde ficara a motocicleta.

Bem, mediante tal condição não precisaram entrar em maiores detalhes. Atendidas que foram no justo pedido do “acordo” devolveram as roupas, não tão rapidamente, mas devolveram. Essa demora na entrega das roupas ficou para eles uma incógnita por não saberem se era para eles insistirem no “acordo”…, ou não. Muito embora até quisessem ficar, isso não seria possível porque, mesmo sendo as “quengas” bondosas ao extremo, tinham eles ainda bastante chão a enfrentar pela frente.

Roupas devolvidas, sutilmente verificaram que nada fora mexido (documentos e dinheiro estavam intactos). Mostrando-lhes onde se encontrava a moto apanharam-na e estando finalmente prontos para a partida, agradeceram por tudo que elas deram e fizeram por eles.

Despedindo-se calorosamente das gentis hospedeiras, estas insistiram para que no retorno ao Rio passassem novamente por lá a fim de contar para elas “novas e interessantes historinhas”.

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Em razão da mudança no comportamento das pessoas através dos tempos, isso contado hoje é um fato difícil de acreditar e com razão, tendo em vista que o conhecido golpe “Boa noite Cinderela” seria o mínimo que poderiam pensar (e com razão) de terem as moças baianas aplicado nos dois a fim de se aproveitarem deles. Mas não foi o que aconteceu. Não aconteceu e nem acontecia porque na época as coisas eram feitas de forma espontânea, honesta e bastante carinhosa. As pessoas viviam e aproveitavam a vida e não somente sobreviviam como muito acontece hoje em dia, que devido ao consumismo exacerbado se matam de tanto trabalhar ficando sem tempo para mais nada.

Após isso saíram finalmente de Ilhéus, mas para poderem seguir caminho, tiveram obrigatoriamente de voltar pelo Posto Texaco de Italma até Itabuna, que dista de Ilhéus aproximadamente 13 quilômetros, para dali então pegarem a estrada principal.

A fim de encurtarem caminho para Recife, decidiram não voltar por Vitória da Conquista, cidade de onde saíram quando estavam na Rio-Bahia. Eles iriam agora por outra estrada, caminho áspero e montanhoso que até as cabras evitavam passar (por isso, chamá-la de estrada é ser bem otimista), mas os levará até Jequié, cidade localizada mais ao norte e perto de Feira de Santana.

Depois de muitos malabarismos com a moto, desviando-a de buracos e pedras, chegaram a Itajuípe, mas continuaram viagem debaixo de sol escaldante, parando mais adiante na cidade de Tesouras para verificarem pequenos estalidos vindos do quadro da moto. Após rápida verificação, constataram que o quadro elástico havia rachado novamente no mesmo lado esquerdo (onde já havia recebido solda) devido às péssimas condições da estrada. Como essa rachadura não iria impedir a viagem (já tinham experiência disso), deixaram para fazer o conserto mais adiante, inclusive porque queriam chegar a Jequié antes de escurecer.

Passaram por Palafós, onde pararam para almoçar e prosseguiram atravessando os povoados de Ubatã, Ibiratai, Jitaúna e Itajuru.

Além dos problemas com os furos na câmara e o rasgo no pneu traseiro; quebra na solda do bagageiro; e a rachadura do quadro; agora o que os perturba é o quique. Algumas vezes, ao acioná-lo, ele derrapa nas estrias não ativando o magneto e assim não é dada a partida no motor. Várias vezes apertaram a respectiva porca de tensão, porém pouco tem adiantado porque ela vai afrouxando com a trepidação do motor. Chegará um momento que não será mais possível quicar a moto por ficar a estria toda desgastada pelo fato do quique girar em falso no momento de quicar. Isso acontecendo, para pegar terá de ser no tranco.

Bem, voltando então à estrada, além das cidades acima citadas, passaram por dois Postos da PRF e finalmente entraram na cidade de Jequié, às 21h, sob a luz do luar, que esteve também excelente neste percurso. Como visto, continuavam sem farol.

A pretensão de alcançar Feira de Santana foi completamente descartada por já ser noite e estarem bastante cansados, razão de pernoitarem em Jequié, que também é cidade grande.

Uma coisa é certa: se qualquer companheiro marcar compromisso e tiver de transitar por estrada de terra, que deixe bem flexível a hora do seu compromisso porque em estrada de terra tudo pode acontecer e causar desencontros.

Motociclistas Invencíveis

Semanalmente vamos publicar, aqui no Viagem de Moto, capítulos do livro Motociclistas Invencíveis, romance extraído de uma viagem com moto ocorrida em 1960.

Conduzindo na garupa da moto um amigo, piloto sai do Rio de Janeiro por estradas de terra a fim de encontrar sua linda namorada, que saindo de Itabuna (BA) para morar no Rio de Janeiro, de repente, da noite para o dia, desaparece sem deixar rastros. Chegando a Itabuna, piloto descobre que ela fugia de assassinos (contratados para matá-la), pelo fato dela ser testemunha do assassinato de seu pai, ex-cacaueiro na região.

Por acontecerem muitas aventuras e novos amores pelo caminho, foram até a Paraíba.

Enfrentaram sol, poeira, chuva e lama. Ajudaram, foram ajudados, acontecendo inclusive que, por levarem uma garota (estava num leito de morte) entre eles dois até ao hospital, salvaram sua vida. Em si, a história mostra como eram os motociclistas Nos Deliciosos Anos Dourados.


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