28º dia – de Manaus a Porto Velho (Estrada Fantasma)

Ainda estava escuro quando os caminhoneiros que dormiam no quarto ao lado acordaram e começaram a fazer o barulho que me acordou. Levantei, vesti a roupa, arrumei a bagagem e levei para a moto. O dia começava a clarear e a mata no entorno da construção estava coberta por uma névoa úmida.

Durante a chuva da tarde anterior eu tinha deixado as aberturas de ventilação da roupa abertas e escorreu água para o interior das botas. Quando cheguei ao bar, pedi para deixar as botas ao lado do fogão a lenha. Quando peguei nessa manhã, tinham secado, mas estavam com cheiro forte de fumaça.

Aos poucos os outros ocupantes dos quartos foram acordando e saindo para continuar suas viagens, incluindo o casal de viajantes espanhóis, que ainda não tinham decidido o que fazer a partir de Manaus. Sugeri que voltassem para Porto Velho, mas disseram que gostariam de conhecer Manaus, por isso preferiam continuar.

O bar não servia lanches, mas o dono ofereceu café. Como não tomo café, peguei água e um pacote de pãezinhos que levava na mala lateral e compartilhei com as pessoas que estavam próximas.

O ar estava úmido e frio, o que me deixou preocupado em relação ao grande atoleiro que me falaram na noite anterior. Se o clima continuasse daquele jeito não secaria tão cedo, pensei.

Despedi dos donos do estabelecimento e dos amigos motociclistas e fui para a estrada, que ainda estava molhada. Nos trechos com cascalho eu conseguia manter a moto com velocidade próxima aos 50, 60 km/h. Nos trechos com argila havia uma nata espalhada com uma trilha um pouco mais seca feita pelos pneus dos caminhões que circularam desde a noite anterior. Conseguia visualizar estes trechos de argila de longe e conseguia reduzir a velocidade para passar com mais segurança, mas a moto seguia com muita instabilidade e rebolando.

O sol demorou para aparecer. Se de um lado ajudava a manter a temperatura agradável, por outro fazia com que a estrada continuasse escorregadia. Isto permaneceu até por volta das 8h30, quando a névoa dissipou e o sol apareceu com força, trazendo o calor.

Por muito tempo viajei vendo apenas algumas casas bastante simples com grande distancia umas das outras, várias delas parecendo abandonadas.

Passei por um caminhão que tinha saído da estrada e estava atolado em um trecho com mato baixo. O motorista fez sinal para que eu parasse e pediu que eu levasse um recado para uma pessoa em Vila Realidade para trazer uma peça da suspensão que tinha quebrado e um cabo para rebocar o caminhão.

Começaram a aparecer pessoas com motos e bicicletas percorrendo a estrada, mostrando que estava chegando a uma cidade.

Encontrei um casal que estava iniciando a travessia da BR-319 pilotando uma Honda antiga. Eram o Suderlander e a Ângela, de Pelotas (RS). Passei informações sobre a estrada e seguimos viagem, cada um em uma direção.

Cheguei a Vila Realidade, onde fica o primeiro posto de gasolina desde Carero. Tinha percorrido 481,4 km e ainda estava com 5,5 litros no tanque. A moto teve um consumo médio de 27,2 km/litro neste trecho da viagem.

Depois de entregar o recado do caminhoneiro para o destinatário, voltei para a estrada.

Ainda rodei por cerca de meia hora por uma estrada de cascalho, quando aos poucos foram aparecendo trechos de asfalto intercalados com trechos de terra. Quando veio definitivamente o asfalto, parei para calibrar os pneus, os quais tinha baixado a pressão para percorrer a terra. O trecho inicial de asfalto estava ruim e com buracos, me fazendo crer que seria melhor se fosse de terra.

Finalmente cheguei ao asfalto novo, quase chegando a Humaitá. Como ainda era cedo, passava pouco das 12h, pensei em não parar em Porto Velho e tentar adiantar a viagem, que agora tinha o caráter de retorno para casa.

Observei no painel da moto que o consumo de combustível estava muito elevado. Mas não fiquei preocupado porque a distância até Porto Velho desde o último abastecimento era menor que 300 km e a moto tinha mantido uma autonomia bastante superior a isto. Pouco depois chequei novamente e assustei. Tinha rodado pouco mais de 140 km e já tinha consumido mais da metade do tanque. Comecei a controlar a velocidade, mas o ponteiro baixava muito rápido. A luz da reserva logo começou a piscar.

Parei na divisa entre os estados do Amazonas e Rondônia para uma foto e vi que o pneu traseiro estava baixo. Peguei o mini compressor, conferi e estava com menos de 20 libras. Enchi o pneu segui viagem. Estava próximo a Porto Velho e resolvi ver se conseguia chegar à cidade. Tinha na mala um kit para reparos de pneus, mas achei que se conseguisse chegar a um borracheiro, ele conseguiria fazer o reparo mais rápido e eu poderia seguir viagem.

Continuei com a luz da reserva piscando e, numa curva, a moto começou a falhar. Parei à frente, tentei ligar e não deu. Estava sem gasolina, tendo percorrido menos de 280 km. Definitivamente a gasolina com a qual abasteci em Vila Realidade não era de qualidade. O consumo foi de menos de 20 km/l, mesmo tendo rodado a maior parte do percurso em velocidade inferior a 80 km/h.

O celular não pegava para pedir um reboque. Fiz sinal para um casal que passava com uma moto, eles pararam, verificaram o celular e também não tinham sinal. O rapaz disse que estávamos numa baixada e provavelmente no alto do morro pegaria. Foi lá e voltou falando que cerca de 400 metros à frente o sinal aparecia. Empurrei a moto até o local indicado e consegui chamar o reboque, que chegou cerca de 1h depois.

Enquanto esperava, em um ponto de ônibus próximo, caiu uma chuva torrencial com vento, raios e trovões e vários motociclistas que passavam na estrada buscaram abrigo debaixo da precária cobertura onde eu estava. Enquanto esperávamos, tive que responder perguntas sobre a viagem. Um dos motociclistas tinha dois venezuelanos abrigados em sua casa. Ele disse que eles iam para o Peru com uma Kombi velha, que quebrou próximo e acabaram ficando para trabalhar em sua marcenaria.

A chuva parou, os motociclistas dispersaram e pouco depois o caminhão chegou. Fomos até um posto de gasolina onde havia uma borracharia. Enchi o tanque e o borracheiro encontrou um pedaço de arame no pneu. O reparo foi rápido.

Havia um hotel do outro lado da avenida. Já que tinha perdido muito tempo com o problema da gasolina e do pneu, resolvi pernoitar em Porto Velho e fui lá ver o preço da diária.

Mais tarde fui até uma lanchonete próxima e comi um sanduíche de frango com suco de maracujá.


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