Chegou o dia tão esperado. Depois de 3 meses de preparação e muita ansiedade, eu estava pronto para pegar a estrada e encontrar meus colegas motociclistas, para uma viagem de moto até a região do Jalapão, no estado de Tocantins. Eu faria esta viagem com uma moto Honda XRE 300 ano 2010.
Alguns saíram de Brasília e outros de Uruaçu (GO). Eu planejei sair de Goiânia, capital do estado de Goiás. Combinamos de nos encontrar em Ponte Alta do Tocantins, conhecida como “O Portal do Jalapão”.
Saí de Goiânia na quinta-feira à tarde, véspera do feriado de Tiradentes. Iria rodar de moto por 300 km até Uruaçu, onde encontraria parte da turma. Chegando a Uruaçu, encontrei meu irmão, pai e tio e alguns amigos que iriam em duas caminhonetes 4×4. Meu irmão e eu colocamos as motos em uma carreta e, na madrugada de sexta-feira, pegamos a estrada.
Após rodas uns 100 km, resolvemos parar para um café da manhã e descobrimos que um dos pneus da caminhonete estava furado. Aproveitamos a borracharia no local e resolvemos este pequeno problema.
Voltamos para a estrada e só parávamos para pegar umas cervejas que estavam na carroceria. Nossa primeira parada turística foi na cidade de Natividade (TO). Uma cidade histórica, fundada em 1734. Tiramos algumas fotos e Partimos rumo a Ponte Alta.
Uns 15 km após Natividade iniciou um trecho de aproximadamente 60 km de estradas de chão até a cidade de Pindorama. Neste trecho a carreta começou a sacudir muito devido à péssima condição da estrada. Resolvi parar, descer a moto da carreta e seguir pilotando, que é o que eu gosto de fazer e o que eu fui fazer ali. Meu irmão decidiu continuar com a moto na carreta até Ponte Alta.
Com a moto eu pude andar mais rápido e logo já havia distanciado bem das caminhonetes. Cheguei à cidade de Pindorama, onde parei em uma sombra, já que o sol estava muito quente, para esperar os colegas. Pouco depois um motociclista em uma XRE 300 parou perto de onde eu estava. Fui até ele e constatei que era um dos amigos do grupo de WhatsApp, mas que eu ainda não conhecia pessoalmente.
Logo chegaram os demais integrantes do grupo. Eles haviam saído no dia anterior da Cidade de Uruaçu, todos de moto. A Maior parte em Ténéré 250cc. Depois chegou também a turma de Brasília, estes em caminhonetes com as motos em uma carreta, Ténéré 250 com relação modificada e pneus de trilha.
Aí começou a festa. Encontro de velhos amigos. Alguns há quase 40 anos e que raramente se viam. Só nos falávamos mesmo pelo WhatsApp. Logo chegou também meu pessoal nas duas caminhonetes.
Depois dessa primeira confraternização, rumamos para Ponte Alta, onde chegamos por volta das 4 horas da tarde. Alguns resolveram se hospedar em uma pousada. Outra parte resolveu acampar nas margens do rio na cidade mesmo. Achamos um local, debaixo de uma grande árvore e armamos o acampamento praticamente no centro da cidade. Ali mesmo tomamos um banho e fomos preparar o churrasco. Tomamos todas. Alguns foram dormir e outros foram aproveitar a noite na cidade. Marcamos de iniciar o circuito Jalapão no outro dia às 7h da manhã.
No horário combinado a turma toda estava reunida para iniciar a aventura. Com ressaca ou sem ressaca, estávamos todos muito animados. Nosso primeiro objetivo seria o Cânion Sussuapara. Após alguns quilômetros de estrada de terra relativamente boa, chegamos ao local. Tiramos algumas fotos e retornamos para a estrada.
Logo começaram a aparecer os primeiros trechos de areia. Inicialmente alguns poucos metros, mas suficientes para fazer nosso coração acelerar, visto que nenhum de nós tinha a menor experiência na areia. Parecia que nosso conhecimento de pilotagem era zero e a moto ficava completamente instável. Não demorou para acontecerem as primeiras quedas. Primeiro foi meu irmão Eduardo. Depois vieram outros.
Na medida em que nos afastávamos de Ponte Alta, os trechos de areia ficavam cada vez mais frequentes e maiores, chegando a centenas de metros de pura areia com mais de 40 centímetros de profundidade. Mais tombos iam acontecendo. Mas alguns já estavam começando a dominar aquele terreno estranho e iam passando as dicas para os demais. Já estávamos todo nos deslocando com mais destreza.
Após algumas horas de treino intensivo, chegamos à cachoeira da velha, no Rio Novo. Um verdadeiro espetáculo da natureza. Uma boa estrutura para que os turistas possam apreciar aquela beleza. Tiramos muitas fotos e fomos para um trecho do mesmo rio, abaixo da cachoeira, em uma pequena praia, onde fomos nos refrescar e descansar para retornar à estrada. Aproveitamos para comer alguma coisa, pois já era meio dia.
Descansados, nos reunimos e decidimos que iríamos pegar um “atalho” para nosso próximo objetivo que era a ponte do Rio Novo, onde iríamos acampar. O problema é que esse atalho consistia em um trecho de 12 quilômetros de pura areia. Isso mesmo. Não seria mais alguns trechos de areia de algumas centenas de metros. Seriam 12 quilômetros de areia fofa, no calor escaldante do Jalapão próximo aos 40 graus.
Resolvemos que iríamos todos por este areal. Meu irmão, na hora de sair, resolveu que iria abortar a missão. Resolveu que iria colocar a moto na caminhonete e iria no conforto do ar condicionado. Ofereceu a um dos amigos que estavam indo de caminhonete a moto e este prontamente aceitou o desafio. Rumamos para o temido “atalho”. Logo de cara começaram os tombos. Aquela areia fofa e ininterrupta era totalmente diferente de tudo que havíamos experimentado até ali. Eu caí duas vezes em menos de 10 minutos. A moto estava muito pesada com a bagagem, o calor estava muito grande e eu já não estava mais conseguindo levantá-la do chão. Resolvi voltar e pegar a estrada convencional. Voltaram também as caminhonetes, mas a estrada “convencional” não estava fácil também não. Os trechos de areia eram muito grandes.
Aos poucos minha técnica foi melhorando e eu já conseguia dominar a moto de uma forma muito superior ao que ocorria no começo do dia. Já estava entrando nos trechos de areia em velocidade próxima aos 70 km/h. Pra vocês terem ideia desta evolução, no princípio do dia nós entrávamos nestes trechos a 20 km por hora. A partir desse momento comecei a me divertir na areia. Já não mais fugia dela, pelo contrário, procurava estes trechos pois havia menos pedras e buracos. A moto dançava de um lado para o outro, mas sempre sob meu controle. Quem me via andando com aquela destreza nunca imaginaria que aquele era o meu primeiro dia em estradas de areia. Foi uma grande evolução na técnica.
Por volta de 4 horas da tarde chegamos ao nosso objetivo. Armamos nosso acampamento em uma praia próximo à ponte e em seguida fomos nas 4×4 conhecer as dunas do Jalapão. Um lugar fantástico. Dunas gigantescas que margeiam um riacho de águas cristalinas, que serpenteia o paredão de areia. Subimos até o alto para apreciar o pôr do sol do Jalapão. Um momento único. Daqueles que fazem valer a pena todos os tombos e o cansaço. Apreciamos o pôr do sol e, no inicio da noite, retornamos para o acampamento, onde fizemos um churrasco regado a muita cerveja. Os motociclistas “nutellas” de Brasília serviram até um cordeiro assado acompanhado com geleia de menta. Muita frescura. Mas até que estava bom. Os raízes fizeram um arroz com carne.
No dia seguinte levantamos cedo e fomos preparar um café da manhã caprichado pra aguentar a próxima etapa. E não é que os nutella trouxeram Nutella, pão integral com castanhas e aveia e leite com Toddy para o café da manhã? Mas também descobrimos que os caras dividem barraca. Muita frescura. Os raízes comeram o resto do arroz com carne da noite passada, ovo frito e pão do dia anterior. Top demais.
Depois do café reforçado, pegamos a estrada. Os caras das 4×4 ficaram pra desfazer o acampamento.
Voltamos para o areião rumo a São Félix, onde iríamos abastecer as motos e seguir para a cachoeira da formiga. Muita areia até chegar, mas valeu a pena.
A cachoeira da formiga é uma cachoeira pequena, mas forma um poço com as águas mais transparentes que eu já tinha visto, com um azul impressionante. Uma das mais belas que eu já vi. A visibilidade dentro da água é de muitos metros. Praticamente dá pra ver a margem do outro lado do poço. Como lá existe uma área de camping, resolvemos ficar o resto do dia, acampar por ali mesmo e de lá sair para conhecer os fervedouros da região.
Os fervedouros são um espetáculo à parte. Um pequeno poço, nascente de um rio, que nasce na vertical, de baixo para cima, com certa pressão. A pressão que a água faz revolve uma areia muito fina no fundo, formando uma espécie de calda muito densa, onde a gente não afunda. Por mais que tentemos não conseguimos afundar. Conhecemos dois fervedouros próximos à cachoeira. Aproveitamos para conhecer o encontro de dois rios. Com um detalhe interessante: um possui a água muito fria e o outro a temperatura da água é normal. No local de encontro, as águas não se misturam. Você pode nadar de um local de água “quente” para outro com a água fria. Bacana.
Retornamos ao acampamento, onde fomos preparar mais um churrasco, tomar umas cervas e contar histórias até a hora de dormir. Dia muito bom. Bom não, espetacular.
A noite é que não foi tão espetacular. Eu uso para dormir um colchãozinho de ar de uns 3 centímetros de altura. É pouco, mas é melhor que dormir no chão duro. E foi o que aconteceu, pois meu irmão conseguiu fura-lo no momento que punha minha tralha na caminhonete. Bem feito, pra aprender a cuidar do próprio equipamento.
Hoje seria o nosso último trecho no Jalapão. Da cachoeira da Formiga até ponte alta, nosso ponto de partida. Parecia que seria o dia menos emocionante, já que os trechos de areia seriam menores e a estrada bem melhor. Mas o guia nos falou de um “atalho”, que diminuía consideravelmente a distancia, mas passava por uma região arenosa que possuía simples 14 quilômetros de areia fofa ininterrupta e que foi usada no Rally dos Sertões. Optamos por fazer esse caminho.
Após uns 100 km na estrada principal, passando dentro de riachos e alguns trechos pequenos de areia e algumas quedas e quase quedas, chegamos ao atalho. Logo de inicio uma placa dizia “Fazenda Desafio 1”. Nada mais original. Antes de iniciar o trecho tivemos que fazer uma pausa mais longa, pois uma das Ténéré, a do Marcos, apresentou pane na ignição. Não dava partida de jeito nenhum. Isso já havia acontecido com a Bros 150 do Renato, que abortou esta parte devido ao problema. Depois de desmontar algumas partes, não conseguimos descobrir a causa do problema. Demos um tranco. O problema seria grande se ela apagasse na areia, pois não haveria como dar o tranco.
Entramos no atalho e logo começaram os tombos. O Marcos tomou um e sua moto apagou. Problemão, pois não havia como ligar novamente. Depois de muitas tentativas de partida, por acaso ela resolver pegar. Seu irmão, Márcio, mais habilidoso, foi na Ténéré e cedeu sua Kawasaki 400 para o Marcos, que aproveitou pra tomar um tombo nela também. Eu, alheio a isso tudo, já estava muito à frente, pois estava pilotando muito bem naquela areia infernal. Estava muito longe quando resolvi parar e esperar, porque já estava preocupado se havia errado o caminho e não havia sinal dos outros.
Parei a moto debaixo de uma pequena árvore e fiquei esperando. Após uns vinte minutos chegou o Rodrigo que foi com seu filho, Fernando. É… esse cara, apesar de ser um dos nutellas, levou o filho na garupa e mandou bem. Depois chegou seu irmão Adriano, que quando tentou parar onde estávamos tomou um baita tombo. Ajudamos a levantar a moto e tirar da estrada. Após uns 10 minutos veio o Marcos na Kawasaki e caiu no mesmo local que o Adriano. Baita tombo também. Em seguida veio o Danilo em sua XRE e, ao ver o Adriano no chão, tentou parar e o que aconteceu? Chão também. Outra queda feia. Mas graças a Deus, nenhum machucado. Todos estavam bem protegidos com armadura, botas, luvas e joelheiras.
Depois que a turma se reuniu, seguimos adiante. O Márcio saiu na frente, seguido pelo Danilo e depois eu. Poucos metros adiante o Danilo comprou terreno novamente. E esse foi tão feio quanto o anterior. Caiu no meio do cerrado arrancando toco no peito. Tô aqui me acabando de rir enquanto digito. Ele se levantou rapidamente e subiu na moto. Nisso passei na sua frente. Logo em frente quase que eu compro terreno e com isso ele me passou novamente. A pilotagem, apesar da dificuldade enorme imposta pelo terreno, estava muito boa. Nosso nível havia evoluído a tal ponto que andávamos em quarta marcha a 80 km por hora em uma estrada sinuosa que mal cabia um carro. Loucura total. A coisa era tão insana que pilotávamos com a roda virada para a direita para seguir em linha reta. Imagina isso. Nesta velocidade, logo chegamos ao fim do trecho. Aos poucos os outros foram chegando. Por último, pelo meio do mato, chegou o Adriano que havia machucado o Joelho e estava pilotando com muita dificuldade. Mas mesmo com o Joelho machucado o cara fez todo o percurso.
Seguimos viagem por mais cerca de 50 km, agora já em uma estrada melhor, até às margens de um pequeno rio, onde paramos para nos refrescar e almoçar, visto que já eram quase 3 horas da tarde.
Depois de um merecido descanso e um almoço bem sortido (sardinha e farofa), terminamos o último trecho do dia até Ponte Alta. Em Ponte Alta nos despedimos do Marcos, Márcio, Rodrigo, Fernando e Lelo, que foram para Brasília levando as motos na Caminhonete. Também foram embora mais cedo o meu Pai Eduardo, o Dudu, meu Irmão e meu tio Toninho, que ficou conhecido na região como o “Terror do Jalapão”. Em seguida encontramos o Jader e o Júnior, que chegaram mais cedo pois não vieram pelo trecho de terra (ficaram com medo).
Como estávamos bem cansados, resolvemos pernoitar em um hotel naquela noite. Depois de instalados, saímos para jantar e tomar uma para descontrair e falar sobre as aventuras dos últimos dias.
Levantamos bem cedo, tomamos um café da manhã reforçado, arrumamos as bagagens nas motos e partimos rumo a Uruaçu. Neste trecho estavam eu, Jader, Danilo e Adriano.
Cerca de 200 km de Uruaçu tivemos uma pane mecânica na XRE do Danilo. A corrente se partiu. Por sorte, o Jader levava em seu kit de ferramentas e peças, elos de emenda e a ferramenta apropriada para o serviço. Resolvido o imprevisto, seguimos viagem.
Chegamos a Uruaçu próximo das 5h da tarde.
Em Uruaçu me despedi dos amigos e fui para a casa dos meus pais, onde passei a noite. Levantei às 5h da manhã e saí para percorrer os últimos 300 km até a minha casa em Goiânia. O restante da viagem transcorreu normalmente e às 10h já estava em casa.
Resumindo estes últimos dias, posso dizer que foram momentos únicos. Uma oportunidade de reencontrar velhos e conhecer novos amigos. O Jalapão é um lugar fantástico. Um lugar ainda bem conservado, onde os recursos naturais se encontram intocados.
Eu posso dizer que tenho uma certa experiência em pilotagem de motocicletas. Já pilotei em estradas do Brasil, Uruguai, Paraguai, Argentina, Peru e Bolívia. Já tinha pilotado muito em estradas de terra. Mas minha experiência em areia era zero. Digo que o Jalapão foi uma pós-graduação, um curso intensivo nesse tipo de pilotagem. Agora digo, estou bem mais confiante para meu próximo desafio que é percorrer a Transamazônica. Mas isso já é outra história.
Nosso Grupo
Eu, André Dias – XRE 300; Eduardo – Falcon 400; Danilo – XRE 300; Rodrigo e Fernando (Pai e Filho) – Ténéré 250; Adriano – Ténéré 250; Divino Jr. – Ténéré 250; Marcos – Ténéré 250; Marcio – Kawasaki KLX 450; Renato – Bros 150; Jader – Ténéré 250.
Os amigos nas 4×4
Eduardo (meu pai); Toninho (meu tio); Paulo; Pedro; Lelo (motociclista também, mas estava lesionado); Darlan; Nauber; Dyou.
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