Uma aventura emocionante pelo Brasil. Pilotando a Yamaha XJ 6 F (Maria Antonieta), percorri 5.489 km, por seis estados, mais o distrito Federal. Um dos momentos mais emocionantes da minha vida. Vivendo de perto a realidade do povo brasileiro, chegando ao limite extremo sobre duas rodas. Passando pela linda costa brasileira, enfrentando desde o início o caos nas estradas brasileiras, totalmente esburacadas, com trechos com alto índice de assaltos, entrando no sertão, vendo de perto a miséria no Brasil, a triste realidade da seca, passando pela Chapada Diamantina, seguindo rumo ao Centro Oeste, com destaque pra chegada a Brasília em meio a protestos.
Nesse relato, vou contar detalhes de como foi viver na pele sobre duas rodas, a realidade do povo brasileiro e conhecer os “diversos países”, durante a viagem.
O primeiro dia começou com a despedida dos familiares e a congestionada Marginal Tietê, em São Paulo. Logo em seguida, entrei na Ayrton Senna e lá na frente peguei a Dutra até o Rio de Janeiro, com destaque pra descida da linda e fechada Serra das Araras. Motociclista, paga pedágio nas duas rodovias e a qualidade das duas, dispensa comentários.
Chegando no Rio de Janeiro, travado no trânsito, vi uma realidade fora da zona Sul mais cruel. Conversando com um rapaz que trabalhava no posto de gasolina, perguntei a ele se por lá tinha um sinal WiFi, ele me respondeu que não sabia o que era aquilo, em seguida me respondeu que ele e os seus amigos nunca tiveram acesso à internet. Como um dos estados mais importantes do país, pode excluir milhares de pessoas que vivem fora da zona sul, nos morros cariocas??? Infelizmente, essa e uma das realidades das capitais brasileiras.
A partir daí, peguei muito trânsito da Dutra, Av. Brasil e em um trecho da BR-101. O dia de viagem chegou ao fim com aproximadamente 600 km percorridos e pernoite na cidade de Casemiro de Abreu, no Rio de Janeiro.
O segundo dia foi com destino ao Estado do Espirito Santo. A BR-101, até então pedagiada, estava perfeita, mas o calor aumentava. Entrando no Espirito Santo, a BR-101, muda de cara e começa a apresentar curvas mais fechadas. Até Guarapari ela fica estreita e cheia de curvas. O número de caminhões é muito grande. Chegando a Guarapari, me apaixonei pelo que vi. Encontrei com o Jeguinho, dos Bucaneiros, que me mostrou as belezas dessa cidade capixaba maravilhosa, com belas praias, tranquilidade e boa infraestrutura. Chegava ao fim o segundo dia.
Fiquei por lá mais um dia e sai apaixonado. Vi, como eu esperava, uma estrada com mais curvas e muitos caminhões. Em um momento fui parar no acostamento depois de uma ultrapassagem criminosa de um caminhoneiro que estava indo pro Rio. Uma estrada perigosa que não te dá espaço para erros e sabia que seria pior mais para o norte, mas com prudência e responsabilidade, tinha em mente que isso seria o de menos, perto da beleza dos lugares.
À noite, caminhando pela cidade capixaba com os amigos capixabas do motociclismo, conheci uma praça com forró e as pessoas dançando ao ar livre, uma cultura popular no Brasil.
Depois de me apaixonar por Guarapari e a cultura capixaba, passei por Vila Velha e Vitória (capital do Espírito Santo), indo pela linda Rodovia do Sol (asfalto impecável e moto paga pedágio). Destaque para a visita ao Convento da Penha. Deixei a moto lá embaixo e fiz um belo exercício para subir as escadarias. Chegando ao topo, foi um momento de grande emoção, uma das imagens mais lindas da viagem até aquele momento! O suor e a subida a pé valeram a pena, fiz minha oração para Nossa Senhora da Penha me guiar e iluminar. Simplesmente lindo! A visão da terceira ponte, com aquele mar e céu azul, emociona qualquer um.
Atravessei a terceira ponte e conheci Vitória, com as pessoas caminhando na beira da praia. Tinha me apaixonado pelo Espirito Santo. Mas, saindo dali, mais uma vez a BR-101 mudou de cara. Segui viagem para a Bahia e a população aos poucos foi mudando suas características.
Passei por um trecho próximo a Linhares que é considerado um dos cinco mais perigosos do país em relação a acidentes. Até então, os buracos não apareciam, tinha apenas a companhia de inúmeros caminhões. A coisa começou a mudar a partir do momento que eu passei da região de Colatina, no Espírito Santo. Andando pela BR-101, sai do chão pela primeira vez. A pista começou a apresentar ondulações e alguns buracos começaram a aparecer. O caos veio de vez, na divisa entre o Espírito Santo e a Bahia. Um verdadeiro descaso na entrada do sul baiano. Vi as primeiras pessoas na beira da estrada, beirando a pobreza, e o acostamento tinha acabado. A situação da BR-101 era caótica. A estrada completamente irregular, com muitas ondulações e buracos, pelas informações a situação continuava dessa forma dali em diante. Faltavam mais 70 km ate Teixeira de Freitas, onde havia planejado pernoitar, que teriam que ser feitos com muito cuidado. Comecei a ver o descaso do governo e tomei um choque, com a realidade do nosso país. Fiz uma parada na cidade de Itabatã e em 20 minutos a cidade teve dois blecautes. As pessoas diziam que isso era constante por lá. Aquilo tinha me deixado absolutamente revoltado e chocado, com o desrespeito e os problemas de infraestrutura do país e com o nosso povo.
Fiz o trecho até Teixeira de Freitas por uma estrada completamente esburacada e nas curvas via centenas de cruzes, simbolizando as pessoas que morreram nos acidentes naquele trecho. Era outra dura realidade do Brasil.
Chegando a Teixeira de Freitas, o sentimento de indignação havia tomado conta de mim. Vi meu país largado e abandonado. Nem imaginava que só estava começando. Em Teixeira de Freitas, fui recebido gentilmente pela Sissa Santiago, do grupo de apoio aos Motociclistas e à noite conheci um pouco mais da cidade baiana. Sabia que o dia seguinte, até Eunápolis, seria um dos trechos mais perigosos da viagem. Precisava ter muito sangue frio, não havia espaço para erros. Preparei-me muito bem psicologicamente, precisava estar bem e focado.
No dia seguinte, me despedi de Teixeira de Freitas e segui rumo a Arraial D´Ajuda. Nunca tinha pilotado numa estrada como aquela. Cheia de curvas e com a pista esburacada, fui na malícia no trecho até Eunápolis. Era uma verdadeira estrada da morte. Curiosamente, naquele momento, parece que você já desvia do buraco meio no automático. Era um buraco atrás do outro e acostamento era coisa rara. O mato cobria as placas. Em certo momento, fiz o desenho da curva com o olhar e tinha que tomar a decisão certa, ao ver as crateras. Tinha comigo a companhia dos treminhãos, que também se viravam como podiam. Fui muito frio nesse trecho, estava muito focado, sentia Deus me guiando.
Cheguei a Eunápolis e peguei a estrada sentido Arraial. UFAAAA!!! Tinha passado por aquilo. Como o governo abandona meu país desse jeito? Pensei, comigo. Aquilo me incomodou demais e eu não podia virar as costas como motociclista e brasileiro, para uma realidade daquela.
Chegando a Arraial, me apaixonei mais uma vez. Encontrei lindos lugares, parecia um filme. Encontrei vários amigos do motociclismo, que eram do grupo de apoio. Foi perfeito. Encontrei várias pessoas que, como eu, saíram para viajar e pararam por lá e nunca mais voltaram. Conheci El Patagon, mexicano e ex-empresário, que decidiu largar tudo depois de um infarto no México e atravessar mais de 29 países com uma Elite 125. Infelizmente, teve sua moto presa no paso fronteiriço da Bolívia para o Brasil. Veio para o Brasil com seu filho e encontrou grande ajuda no Arraial por parte do Chaves, amigo motociclista que saiu de Porto Alegre e, quando conheceu Arraial, decidiu ficar por lá. Hoje está casado e tem uma pizzaria. El Patagon pretende ficar no Brasil e se casar.
Pela costa do descobrimento, conheci Trancoso, Porto Seguro e Santa Rita de Cabrália. Não conheci Caraíva por causa dos protestos dos índios Pataxós, que fecharam a rodovia, por tempo indeterminado. Lindos lugares, com lindas histórias. Estava completamente tomado por aquele momento. O motociclismo me fazia manter o contato com as pessoas e as culturas de perto.
Fiquei por lá, alguns dias. Fiz grandes amigos, conheci pessoas inesquecíveis e sei que ia partir com dor no coração, mas era preciso seguir a rota. Ali aprendi que devemos sempre amar, respeitar mais as pessoas, entender o verdadeiro sentido de companheirismo e então veremos o grande valor da vida e do homem e que aquele relógio de ouro não é critério pra definir algo e assim seremos muito mais humanos e viveremos intensamente, porque descobrimos o verdadeiro significado da vida.
Na saída de Arraial, despedi de todos os grandes amigos que fiz e também de El Patagon, que me chamou carinhosamente de Capitão América paulista, desvendando as estradas brasileiras. Nos últimos momentos em Arraial, levei comigo um grande ensinamento de El Patagon: “Hay que ser loco para disfrutar”. . . Imaginem, como eu peguei a estrada sentido Ilhéus, aquele dia.
Seguindo para Ilhéus, a chuva do inverno do Nordeste me deu boas vindas na BR-101. A estrada tinha melhorado muito, apresentava poucos buracos e já tinha acostamento. Peguei um trecho de tráfego lento por causa de um caminhão tombado e mais um acidente logo à frente.
A pobreza agora era escancarada e explícita. Crianças vendendo objetos na beira da rodovia, prostituição de menores, casas muito pobres na beira da BR-101. Idosos já sem forças pra lutar, além do perigo de assaltos na rodovia. Um Brasil que muita gente prefere não enxergar e esconder. Há momentos na viagem que você tem que ser frio com os riscos, mas deve estar sempre firme e atento.
A chegada a Ilhéus, mais uma vez, teve apoio do grupo de apoio aos motociclistas. Ilhéus dispensa comentários, por sua beleza natural e seu grande acervo histórico e, com certeza, será uma cidade memorável na viagem. Além dos belos lugares e praias, tive o prazer de conhecer a casa de um grande representante da cultura brasileira. A casa de Jorge, eternamente Amado!!!
Despedi-me de Ilhéus com uma bolha no pé, e segui para Itacaré, dessa vez pela Linha Verde. Chegando a Itacaré, vi uma linda cidade, com bastante tranquilidade, lindas praias e com opções de trilha. A estrada era muito boa, afinal de contas, por ali passam os gringos e os turistas, e eles precisam deixar esse trecho em ordem para deixar a sensação de que tudo é perfeito e surreal.
O grande drama veio à noite. A parte do pé que troca a marcha estava completamente roxa! A bolha virou um grande problema! Não conseguia mais andar. Fui mancando até o Hospital de Itacaré. Chegando lá, mais uma surpresa: o médico responsável pelo período tinha saído pra resolver problemas particulares. Em comunicado, o hospital pedia a ajuda de todos os meios para continuar funcionando. Um retrato da saúde abandonada no Brasil! Depois de um tempo, ele chegou. Tomei duas injeções e fui medicado. UFAAA!!! Já conseguia andar, a sequência da viagem não estava mais em risco. Tomei mais algumas injeções e fiquei mais um dia em Itacaré antes de seguir viagem.
No dia seguinte, rumo a Valença! Peguei trechos com chuva até a chegada a Valença. Mais uma vez tive apoio do amigo Giovani, do apoio ao motociclista. Maria Antonieta ficou por lá, na casa do Giovani e então, peguei a lancha rápida para o encontro com a Ilha do Morro do São Paulo.
A Ilha é fantástica, com muitos turistas estrangeiros. Há momentos em que parece que você está fora do Brasil. Mais uma vez, me apaixonei. No Morro, o sossego predomina, os traços africanos da cultura brasileira se apresentam. Tem gente de todo o mundo, buscando o diferente, o fora do real, outro Brasil no meio de tantos que nós temos nesse país gigante e multicultural! O pôr do sol, é um verdadeiro filme, chega a emocionar. Com lindas praias e piscinas naturais, Morro do São Paulo é considerado um dos mais lindos lugares da costa brasileira.
Fiz um passeio maravilhoso por todas as ilhas próximas como Boipeba e Gamboa. Um lugar lindo, que proporcionou momentos maravilhosos. Era o último local da costa brasileira.
Despedi-me das ilhas para fazer a transição para o sertão e a Chapada Diamantina. Queria aproveitar e dedicar o lindo pôr do sol do Morro de São Paulo ao nosso lindo país e a todo o povo brasileiro!! Um país tão lindo não pode ter sua população na miséria e com estrada esburacada, com risco de assalto!
Nesse momento, tinha duas opções para chegar à Chapada Diamantina: por Amargosa, passando pelo Sertão ou subindo pela BR-101, até Feira de Santana, considerado um dos trechos mais perigosos do Brasil em relação a assaltos. Não pensei duas vezes: escolhi o Sertão.
Mais uma vez, vi o povo do meu país na miséria e as estradas esburacadas e abandonadas. A população não têm estrada, segurança e muito menos dignidade. As pessoas que são cabo eleitoral do governo, estão à beira da estrada passando fome e não têm acesso a cultura, porque não convém para o governo. É triste ver o que esse governo faz com o meu país, ver o povo pedindo socorro e o governo oferecendo esmola de 70 reais. Estava partindo rumo ao sertão, vendo mais uma vez o povo do meu país beirando a miséria e com uma estrada de quinto mundo. Vergonha!!!!!
Em um trecho de sertão a estrada melhorou quando cruzou com a BR-116, seguindo até Iaçu. A paisagem do sertão é linda, fiquei emocionado ao atravessar aquele trecho, era surreal.
De Iaçu para Itaberaba, mais uma vez a emoção deu lugar a revolta: percorri 30 km até Itaberaba, em um trecho completamente largado e abandonado. Um descaso, claro e vergonhoso com a população brasileira. Logo após Itaberaba, entrei na BR-242. O pernoite foi na linda cidade de Lençóis, dando as boas vindas à Chapada Diamantina. Finalizei, um dos dias mais difíceis da viagem.
A verdade é que São Paulo e Rio de Janeiro são completamente fora da realidade do país. Fica visível a miséria, o país não possui sequer estradas. Do governo eu já não tinha mais estômago pra falar. Corrupto em época de eleição, essas mesmas pessoas abandonadas vendem seu votos até por um pouco de comida. É uma cena, muito triste de se ver. A viagem tinha tomado uma imagem mais política. Se fosse para esconder a realidade do meu povo, faria o retorno e voltaria pra casa. Educação, saúde, estradas, tudo absolutamente largados e em condições precárias.
Em Lençóis, fiquei em um Hostel, onde conheci muitas pessoas e fiz novas amizades. Visitei a cidade à noite, com belos bares e boa opção de vida noturna. Pela manhã, fiz uma caminhada apreciando um pouco mais dessa linda cidade, antes de seguir para a estrada na parte da tarde.
Havia um motivo muito especial e diria que o mais bonito da viagem: vovô mora em Boninal, uma cidade próxima, está com 102 anos, já fazia algum tempo que não o via e ele estava prestes a fazer mais um aniversário.
Segui viagem com o coração a mil e ansioso pelo grande momento. À tarde, comecei a subir a Chapada Diamantina, até chegar ao Morro do Pai Inácio: QUE EMOÇÃOOO!!! É simplesmente Lindo subir a chapada sobre duas rodas! Posso escolher as palavras mais bonitas que não vou conseguir descrever o prazer que o motociclismo me proporcionou nesse momento.
Era uma emoção muito grande, levantar a bandeira do motociclismo na Chapada Diamantina. Mais uma vez levava a bandeira da igualdade, da filosofia das duas rodas em que não existem divisões, somos todos iguais e aproveitava aquele momento especial para mais uma vez reforçar os valores e as coisas simples da vida.
Dali em Diante, passei pela bela cidade de Palmeiras, com uma paradinha para abastecimento em Seabra, antes de seguir para a cidade do vovô. Boninal fica em uma área de transição entre a Chapada Diamantina com fortes características de sertão.
Chegando à cidade, a comunicação era muito difícil, pois não havia sinal para celular. Fiquei surpreso ao ver o centro da cidade bloqueado e cheio de correntes. O motivo são os frequentes assaltos ao banco da cidade. Segundo informações, a cidade teve seu prefeito eleito de forma duvidosa e escandalosa e há fortes indícios de corrupção. Dessa forma, as coisas vão se encaixando. Estradas esburacadas, população abandonada e a corrupção corre solta nas pequenas cidades brasileiras! Estava na cidade do vovô, mas para chegar até sua casa teria que pegar um trecho off road, passando por diversos vilarejos.
No dia seguinte, segui rumo a casa do vovô e a mais pura cena da realidade do nordeste: seca, pobreza, pessoas mais uma vez sem forças pra lutar, gado morrendo de sede. Nunca imaginei que o motociclismo me levaria à realidade extrema do Brasil. O trecho foi de cascalho e bacias de areia. Maria Antonieta sofreu um pouquinho, mas segurou a bronca.
Finalmente, depois de atravessar diversos vilarejos, um lindo momento: me encontrei com o vovô. Ele me deu um abraço, muito contente e disse que estava muito feliz com minha visita. Sorria, como uma criança. Aquilo não tinha preço. Caminhando pelo vilarejo, vi a lagoa já sem água. O sertão do nordeste pedindo socorro! Vovô sempre foi muito religioso e, mesmo com os seus 102 anos, não perde sua fé e vocação. Na sua casa tem o seu altar, onde recebe e reza pelas pessoas da região! Antes de ir embora, ele rezou por mim e pediu que Deus me levasse de volta pra casa. Com sua pureza e o seu carinho, me disse para voltar em breve. Emocionante! Despedi-me, com a sensação de dever cumprido!! Fiquei em Boninal mais um dia, antes de seguir a rota para o Centro Oeste.
No dia seguinte, fui até Cristópolis, próximo a Barreiras, enfrentando um calor tão grande que me provocou um alto desgaste.
A beleza de Lençóis, a sensação de subir a Chapada sobre duas rodas, o encontro com o Morro do Pai Inácio, até a chegada a lugares extremos, com o clima do sertão predominante e a crueldade da seca. Nunca havia imaginado chegar sobre duas rodas a lugares tão extremos do país. Mais uma vez, o motociclismo quebrou barreiras e limites. Levo comigo as grandes pessoas e o grande abraço do vovô, mas vou levar também o descaso do nosso governo corrupto, que está destruindo o futuro do nosso país. As estradas estão abandonadas e esburacadas, foram tantas trepidações que a minha placa não aguentou. As pessoas estão passando fome, sem acesso a nenhum tipo de cultura. Pessoas que não trabalham mais ou estão aumentando o número de filhos por causa das bolsas do governo, usadas como estratégia eleitoreira, que o mantém no poder. Fica evidente que o Brasil não é um país representado pelos grandes centros. O Brasil é um país rural, com sua grande força na agricultura e criação de animais. Dizer que o Brasil é um país de cor predominante branca é uma tremenda aberração. Sua população se formou por multiculturas. O Nordeste do Brasil revela os nossos traços africanos, com grande predominância de negros.
Uma coisa me chamou muito atenção na divisa da Bahia com Goiás: a característica dos dois estados muda completamente depois da divisa! Fiz uma parada em Formosa, Goiás, antes de seguir para Brasília. Coincidência ou não, depois de ver o descaso do governo e ver um Brasil extremante pobre e abandonado pelos nossos políticos era hora de conhecer Brasília! Sabia, que chegando lá o povo brasileiro não estaria calado. E eu estava certo: quando entrei em Brasília, com destino ao Congresso Nacional, Senado e Superior Tribunal para algumas fotos, fui pego de surpresa com a população protestando por melhorias. Fiquei com a moto no meio dos protestos. Foi um momento tumultuado e ao mesmo tempo muito interessante na capital federal. O povo brasileiro estava nas ruas.
Passei também pelo Mané Garrincha (Estádio Nacional de Brasília), o estádio mais caro do Brasil, sequer foi finalizado ainda. O país com sua população na miséria, nem ao menos estrada existe, mas com investimentos pesados nos estádios da Copa. Tem alguma coisa errada aí!
Despedi-me de Brasília na parte da tarde, pernoitando na cidade de Anápolis, antes de seguir para Goiânia no dia seguinte. Acordei cedo e parti para Goiânia, onde mais uma vez tive o apoio do amigo motociclista, Wander Freitas. Por lá conheci um pouco mais da história do Centro Oeste e do estado de Goiás.
Goiânia é uma cidade em constante crescimento, mas vive problemas sérios de segurança, como todas as outras capitais brasileiras. Uma cidade com uma grande história e de grande importância para o Brasil. Fiz grandes amizades e visitei amigos, que fizeram também grandes viagens sobre duas rodas.
A viagem estava chegando ao final. Era um dos últimos momentos. Despedi-me do amigo Wander e segui para Itumbiara, última cidade do estado de Goiás. Àquela altura, a emoção já estava nas alturas, passava um verdadeiro filme na cabeça. Depois de chegar a Itumbiara, jantei e fui para a cama, com a cabeça a mil, me preparando para o último dia da viagem. Já não tinha mais estratégia, preparo físico e psicológico, era tudo na emoção.
No último dia da viagem, antes de partir, agradeci muito a Deus e pedi muita força nesses últimos momentos. Levava comigo os lindos lugares e momentos, as mais belas histórias, pessoas especiais, e principalmente a realidade do meu país e do povo brasileiro. Era um conjunto que passava pela minha cabeça enquanto estava na estrada.
No triângulo mineiro, me perdi por 40 km. A sinalização confunde um pouco, fui me encontrar só mais tarde. Rodei parte de Minas, até atravessar o rio e entrar no Estado de São Paulo, pela rodovia Anhanguera.
Quando cruzei a divisa foi como um choque: entrando no estado de São Paulo, parecia que eu estava entrando em outro país: a estrada não tinha mais nenhum risco, homens cortando a grama ao longo da rodovia, com serviço de auxílio 24 horas. Percorri a Anhanguera, entrei na Bandeirantes, até chegar na Marginal Pinheiros, com destino ao Butantã, com a emoção explodindo e o coração apertado. Chegava o final da viagem. A ficha parecia que ainda não tinha caído. A sensação de vitória é fenomenal. Pulava e sorria como um menino que tinha ganhado um presente novo, mais um sonho realizado.
Levo comigo inúmeras histórias e momentos. Mais, que isso, levo grandes pessoas, para as quais passei a sentir um grande carinho, respeito e admiração! Foram mais de 20 dias, inúmeros lugares, climas e culturas diferentes. Relatos de grandes pessoas, que largaram tudo por um sonho. Não há como não se emocionar, diante de todos esses fatos. O aventureiro tem aquela coisa de querer o limite do surreal. O motociclismo é uma magia de outro mundo, que te liberta, aproxima e faz história para sempre.
Foram 5489 km de muita emoção durante 22 dias rodando pelo Brasil. Foi a viagem mais difícil das três que eu fiz até hoje de moto. Vivi de perto a realidade do povo brasileiro. Nosso país é muito lindo, mas ao mesmo tempo, muito pobre, desigual e extremamente desumano. Nosso povo é muito pobre, vive na miséria. Que os grandes centros não nos iludam. O país tem recursos, mas sua renda é muito mal distribuída. Esse novo país que o governo tanto falou, infelizmente, não existe. Caminhando pelas estradas brasileiras, me deparei com uma série de cruzes, representando as vidas interrompidas. Chegou um momento em que ter poucos buracos na rodovia, era privilégio. Faço um pedido a todos: não esqueçam do povo brasileiro. O povo brasileiro vive na miséria e precisa da nossa ajuda! O motociclismo tem uma força muito grande, o povo unido também.
A emoção de voltar pra casa é muito especial. Quero agradecer imensamente o carinho de vocês. Agradecer ao AME BR e a todos os amigos motociclistas e não motociclistas, que tiveram total influência no sucesso dessa aventura.
Nesse momento de grande emoção, fico sem palavras. Somente posso dizer muito obrigado a todos! Obrigado, meu Deus!!!Estamos e estaremos juntos sempre!!!VALEU BRASILL!!!!
Roteiro:
- São Paulo – Casemiro de Abreu-RJ
- Casemiro de Abreu – Guarapari-ES
- Guarapari – Teixeira de Freitas-BA
- Teixeira de Freitas – Arraial D´Ajuda-BA (Porto Seguro, Trancoso, Santa Rita de Cabrália)
- Arraial D´Ajuda – Ilhéus-BA
- Ilhéus – Itacaré-BA
- Itacaré – Valença-BA (Morro de São Paulo)
- Valença – Lençóis-BA (Via Amargosa, trecho Sertão, Cruzando BR-116, Iaçu, Itaberaba)
- Lençóis – Boninal-BA (Passando pelo Morro do Pai Inácio, Palmeiras e Seabra)
- Boninal – Cristopólis-BA
- Cristopólis – Formosa-GO
- Formosa – Brasília-DF – Anápolis-GO
- Anápolis – Goiânia-GO
- Goiânia – Itumbiara GO
- Itumbiara – Uberlândia – Uberaba – São Paulo-SP
Total percorrido: 5489 Km
Estados: 6 + Distrito Federal
Consumo Médio:16 A 20 km / litro
Preço da gasolina: de R$ 2,90 a R$ 3,15
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