Rio das Flores e Conservatória

A motocicleta é um veículo que serve de válvula de escape para grande parte de nossos problemas. Nada como um passeio de moto nos finais de semana para espairecer. Sempre temos opções de conciliar uma agradável viagem com um bom Encontro de Motos. Este é o caso de Rio das Flores, localizada no Vale do Paraíba e que teve sua época áurea no ciclo do café.

Anualmente na primeira semana de abril, já temos agendado um passeio para aquela região.

A Historia

A região começou ser colonizada intensamente a partir do ciclo do café. Em 1851 construiu-se uma capela dedicada a Santa Tereza instituíndo a Freguesia de Santa Teresa de Valença, então distrito de Marques de Valença.

A região começou a enriquecer muito com as lavouras de café, ao ponto de em 1882 ser inaugurada a estação da Estrada de Ferro Rio das Flores, e em 1890 emancipou-se do município de Valença tornando-se Vila de Santa Teresa.

Devido à Lei Áurea e à crise econômica do primeiro ciclo cafeicultor, a cidade foi entrando em declínio, sofrendo acentuado êxodo e gradual câmbio do foco produtor para o setor pastoril. Em 1929 a vila foi elevada à condição de cidade e em 1943 passou a se chamar cidade de Rio das Flores.

Ao longo do século XX, as lavouras de café foram substituídas por pastagens e a economia municipal passou por período de estagnação. Em um primeiro momento, a cidade refletiu a atrofia econômica, afetada pelo êxodo rural. Embora a maioria daqueles que abandonaram a agricultura tenham se dirigido para centros próximos de economia mais dinâmica, como Valença e Três Rios, uma parcela procurou se fixar na sede municipal ou mesmo nas sedes distritais. Assim, enquanto parte da População abandonou a cidade em busca de melhores oportunidades, os vazios foram sendo preenchidos pelos que provinham das zonas rurais.

Atualmente tem sua economia baseada na agropecuária e no turismo.

A Partida

Partimos de Macaé na 6ª feira (08/04) pela manhã. Eu(Gomide) e Gata(Lena), Daniel e Thaiza, Alberto e Fátima, Almir e Rosana (MC EU, GATA E CÃO FIEL), Joe e Vitor (seu filho), Vitor (MC MACAÉ) e Motomura e seguimos em direção a BR 101. Fizemos uma pequena parada no posto Oásis (Casemiro de Abreu), para agregar ao grupo o casal Roberto e Flávia (MC EU, GATA E CAO FIEL), que partira de Rio das Ostras.

Seguimos até o Alemão em Itaboraí para reabastecimento e daí partimos em direção a Serra de Petrópolis. Pegamos a estrada que liga Itaboraí ao Rio com um fluxo intenso de caminhões até que chegássemos a Xerém (início da Serra de Petrópolis). Ao iniciar a subida da Serra, tivemos nossa passagem travada por um caminhão com largura de 3,60 metros, e que não possibilitava a ultrapassagem. Levamos uns bons 10 km retidos em sua traseira, até que uma obra de manutenção na estrada fez com que ele tivesse que parar e aproveitamos para ultrapassa-lo. Subimos até Petrópolis e paramos no Restaurante do Alemão no alto da Serra, para apreciar seus deliciosos croquetes e sanduíches.

Partimos então pela BR-040 em direção ao nosso destino. A estrada é composta em boa parte por curvas deliciosas que passam por todo Sul Fluminense em direção a Belo Horizonte, cortando localidades como Petrópolis, Itaipava e São Pedro do Rio. Chegamos ao acesso a Valença e Rio das Flores onde teríamos mais 50 km até o nosso destino.

Rodamos até a comunidade de Manoel de Moraes, onde existe um pequeno restaurante a 7 km de Rio das Flores, e sempre paramos para almoçar. A comida é caseira e bem simples porém com um paladar delicioso. Galinha da roça (?), carne seca com abóbora, arroz e feijão satisfizeram nossa fome. Chegamos em nosso destino pelas 15 horas e fomos buscar hospedagem.

A cidade conta somente com duas pousadas e nesta época, todo o município se mobiliza para acomodar os motociclistas presentes. Ficamos na casa da Lelita, onde em três quartos, nos acomodamos Eu e Gata e Daniel e Thaisa (em duas suítes), Vitor em quarto a parte e os outros amigos, espalhados em casas anexas. Ela sempre recebe com muito carinho, já disponibilizando à mesa, café, leite, frutas diversas, queijos, presuntos entre outros.

Tomamos um banho e à noite partimos para o evento. Habitualmente, na sexta-feira, é mais tranquilo e ficamos tomando um “Cão Fiel” e batendo papo, no caminhão do Márcio (criador do evento e presidente do Yankees MC). Este é um Truck Bar, muito bem estruturado, que possui grande balcão com diversos bancos e mesas. Ficamos até as 3:30h da manhã, já que marcamos passeio pela manhã a Conservatória. Recomendamos àqueles que não conhecem Rio das Flores, um passeio pelas diversas Fazendas do ciclo do café que hoje se tornaram museus e pousadas.

Um dos grandes destaques da região é a Estrada União Indústria, datada de 1854, que ligava o Rio de Janeiro a Juiz de Fora em doze horas, passando por doze estações de trocas de cavalos. Cabe lembrar que a única estação existente atualmente localiza-se em Mont Serrat, na divisa entre Rio e Minas Gerais.

Matriz de Santa Tereza D`Ávila,
com o busto de Santos Dumont ao lado

Além da riqueza natural da região, os visitantes não podem deixar de entrar na matriz de Santa Tereza D` Ávila, local onde foi batizado o “pai da aviação”, Alberto Santos Dumont, aos quatro anos de idade, em 20 de fevereiro de 1877. Santos Dumont permaneceu em Rio das Flores até os seus seis anos. Em 1881, a igreja sofreu um incêndio, vindo a ser reconstruída em estilo neogótico e reinaugurada em 1887.

A história do café revela a prevalência de diversos barões na região, incluindo o do Rio Preto, o de Rio das Flores, o de Santa Justa, o de Menezes, entre tantos outros. Existem ainda 40 fazendas históricas na região, estando oito delas abertas à visitação pública.

Fazenda Paraíso – Essa fazenda foi construída para atender às necessidades do Visconde do Rio Preto e, atualmente, a propriedade se mantém no estado original sem ter sofrido nenhuma modificação.

Vista geral da sede da Fazenda Paraíso

Na visita, é curioso poder apreciar as máquinas do séc. XIX, provenientes da Filadélfia (EUA), que eram usadas para o processamento do grão do café. Logo na entrada, o visitante se defronta com uma bela alameda ornada com palmeiras imperiais. Na época, as palmeiras indicavam que naquele local moravam pessoas nobres, pois elas só costumavam ser oferecidas a detentores de títulos nobiliárquicos.

Passeio a Conservatória

Como já estivéramos nos anos anteriores em Rio das Flores, resolvemos aproveitar a proximidade (52 km) e fazer um bate e volta até Conservatória. Além do grupo anterior, agregamos um novo parceiro (Ioney), que estava hospedado na Lelita e resolveu participar da empreitada.

A História

Conservatória cresceu e prosperou durante o ciclo do café da economia brasileira, a partir do século passado. A cidade, hoje distrito do município de Valença, foi um importante elo na produção e circulação do produto, abrigando mais de 100 fazendas que plantavam o café e o escoavam pelo antigo caminho ferroviário que vinha das Minas Gerais e ia para a Corte, na cidade do rio de Janeiro, de onde seguia para o porto e outras cidades do país.

O primeiro registro da localidade data do final do seculo XVIII, a partir de um relato de 1789, em que Conservatória era reserva dos índios Araris, “elegantes e desembaraçados”, segundo o naturista Saint Adolph, um dos primeiros historiadores a registrar o fato. Diversas histórias justificam a origem do nome, sendo que a mais corriqueira diz que o lugar era conhecido como “Conservatório dos índios”, um lugar de excelente clima e protegido por montanhas, onde os Araris se recolhiam para se recuperar de doenças que dizimavam as tribos e local no qual resolveram se instalar definitivamente. Em 1826, existiam cerca de 1.400 índios aldeados na reserva, vivendo felizes no lugar de onde seriam exterminados pelos desbravadores colonialistas. Vestígios dos Araris, como artefatos em cerâmica e algumas ossadas, já foram encontrados em escavações feitas em diversos locais da região.

Segundo Saint Adolphe, cientista botânico francês, os índios “Araris” eram “quase” brancos, elegantes e desembaraçados e, ainda, segundo Saint Hilaire, outro cientista francês que andou por estas plagas, “esses índios, pela aparência, costumes e desenvoltura, deviam ser descendentes dos “Goitacás de Campos”.

Serenata e paixão

A prosperidade econômica do final do século XIX deu início a outra tradição na vila: a das serenatas – a música cantada sob o sereno -, que hoje atraem mais de mil pessoas a cada fim-de-semana para a cidade, vindas dos mais diversos recantos do país e do exterior.

Um dos grandes motivadores da tradição da música na cidade é o Museu da Seresta, que tem o maior acervo de músicas de serestas do país – e um dos maiores do mundo -, criado pelos irmãos Joubert de Freitas e José Borges Neto, já falecido. O museu mantém viva uma página da cultura musical brasileira, reunindo os seresteiros às sextas-feiras e sábados à noite, que de lá saem para cultivar o hábito, raramente quebrado, de cantar pelas ruas da cidade.

Em 1998, Conservatória comemorou 120 anos de serenatas. Conta a história que a tradição nasceu com um romântico professor de música e tocador de violino, Anreas Schmidt, que, em uma noite enluarada no silêncio do vilarejo, atraiu espectadores, e o professor Andreas passou a ter como rotina tocar seu violino na praça, nas noites estreladas. Aos poucos, músicos vindos de outros lugares passaram a acompanhar as serenatas do professor, e essa virou uma característica incorporada ao lugar.

O passeio

Partimos pela manhã, e conforme orientações, deveríamos entrar a direita de Valença, evitando o transito interno e seguir até a entrada da estrada nova, com distância prevista de 52 km. Após a passagem de Valença, fomos observando as placas à direita, e a única que vimos informava faltar 21 km até Conservatória. Ao final do trecho, nova placa de 24 km na rotatória para Barra do Piraí e nosso destino.

Na realidade, este erro nos proporcionou um novo passeio por estradinha de muitas subidas, descidas e curvas, com passagem por Ipiabas, delicioso vilarejo muito bem tratado, onde vi uma placa de um Bar chamado acho que Zach (Se dirigir não beba, se beber nos procure), além de passarmos por um túnel construído na época dos escravos, onde não teríamos passado caso tivéssemos acertado o roteiro informado.

Chamado de o Túnel Que Chora – assim conhecido por conta das gotas vindas da nascente sobre ele e em função de uma das canções de amor por Conservatória composta pelo seresteiro José Borges de Freitas (“…dizem que é de saudade que o túnel vive chorando…”)-, com 100 metros de extensão, cavado na pedra bruta a mão pelos escravos e por onde trafegava a Maria Fumaça.

Lá chegando, fizemos pequena tour pelo centro e procuramos o restaurante Taberna, recomendado pelo seu Bacalhau e comida mineira.

Além da boa comida, sempre tem um seresteiro dando canja em seu palco. Lá saboreamos um delicioso bolinho de bacalhau e partimos para as linguicinhas, costelas e outros petiscos mais, até quase o final da tarde.

Antes de partir, passamos por uma chocolateria, onde apreciamos os café expresso, chocolates gelados com creme, irish coffe entre outras delicias e começou a chover. Corremos em direção as motos e a chuva finalmente desabou forte. Notei que ela se aproximava em maior volume e chamei a todos para partir rápido em direção a Valença onde ainda estava mais claro. Seguimos então, após orientação da menina da chocolateria pelo caminho mais rápido. Outra deliciosa estrada, totalmente nova e cheia de curvas, onde no início tivemos que fazer em baixa velocidade em virtude da forte chuva. Porém, foi bem rápido e logo chegamos a Rio das Flores (no Jornal da Globo a noite saiu relato de que em Barra Mansa (próximo de Conservatória), a chuva foi violentíssima e de granizo, deixando muitas casas e milhares de desabrigados). É, graças a Deus que São Pedro era nosso parceiro.

Chegamos em Rio das Flores e resolvemos dar uma passada pelo evento. Ele estava completamente lotado, com milhares de motos. Ao estacionar, encontamos uma amiga de Rio das Ostras (Tatiana) chegando com o seu namorado. Fomos cumprimentá-los e logo me catucaram para olhar a moto dele. Era uma Ducati Multistrada 1200, lançada no Salão de Milão em 2010, e meu sonho de consumo. Ele notou e me ofereceu para dar uma volta. Prontamente aceitei, e dei uma pequena rodada pelo gramado do evento. Que delícia! Ao estacionar, procurei o local da chave para desligar a moto, porém ela tem somente o start para deliga-la e funciona com controle remoto. Pura tecnologia, vou ver se algum dia chego lá.

A noite, fomos de novo para o evento e nos estabelecemos novamente no Truck Bar, onde nos encontramos com Cebola, parceirão de Macaé que sempre viaja conosco, porém ficou em outra casa. O evento continuava lotado, muito bom Rock and Roll, “ Cão Fiel” a rodo e um grande papo com os amigos, que rolou até as 1:30h da manhã. Partimos, já que pela manhã, teríamos uma boa quilometragem pela frente.

Partimos em grupos, seguindo por novo caminho, em direção a Rodovia Dutra, que segundo informações, seria mais curto, saindo na frente Daniel, Vitor e Alberto e alguns minutos depois, Eu e Gata e Roberto e logo depois, Almir e Rosana. Fomos lentamente esperando que Almir nos alcançasse. Passamos por um acidente próximo a Valença com dois corpos ao lado (conforme relato de Roberto) da estrada. Eu simplesmente olhei para o lado, não gostaria de terminar a viagem com imagem triste. Paramos numa pequena praça e esperamos por meia hora aproximadamente e não conseguimos contatar Almir por telefone. Como Daniel e Vitor já se encontravam bem a frente, seguimos e entramos em direção a Vassouras. Encontramo-nos com Daniel e Vitor em Posto próximo a Vassouras. Finalmente conseguimos contato telefônico com Almir, e combinamos de nos encontrar no restaurante Kilomania em rio Bonito, já que este tinha seguido por Barra do Piraí.

Meninas na volta às compras, olhem a cara de felicidade.

Neste novo caminho passamos por Mendes e sua Serra em direção ao Rio. Recomendo o passeio, a estrada é de pequenas dimensões porém cheia de curvas, muito verde e em quase toda sua extensão, coberta pelo cruzamento das arvores, fazendo túneis de muita sombra. Chegamos então em Paracambi e optamos por não seguir em direção a Dutra, conforme orientação repassada a Daniel. Passamos por estradinha de pouco movimento, conhecemos o “Lixao de Paracambi”, com odor horrivel e finalmente chegamos a Japeri, já na baixada fluminense. Logo adentramos a Dutra e chegamos a Linha Vermelha e Ponte Rio-Niterói. O Roberto se desgarrou e paramos no Posto de Gasolina após o Carrefour para aguardá-lo, e batemos os braços quando ele e Almir cruzavam a BR 101, porém sem sucesso, Partimos em direção ao Quilomania e não conseguimos localizá-los. Almoçamos e seguimos para Macaé, chegando em casa já as 16 horas, tempo de ver pela TV o meu Fluzão massacrar o Americano por 5X1.

Graças a nosso bom Deus, chegamos mais uma vez inteiros e já pensando em nossos próximos passeios.

Até lá.

P.S: Cão Fiel é chamado o Whisky, já que Vinicius de Morais dizia ser “O melhor amigo do homem, o Cão engarrafado”.


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