No dia 9 de dezembro de 2017 começou a maior aventura de minha vida. Largar tudo e iniciar uma viagem de volta ao mundo com uma Honda Biz 125, acampando e fazendo minha comida para poder viajar mais com o pouco dinheiro que eu tinha para um projeto deste tamanho.
A viagem começou em Santa Catarina. Saí em direção a Foz do Iguaçu para rodar pelo Paraguai pela primeira vez, com receio por tudo que tinha ouvido antes, mas foi supertranquilo rodar por lá e conhecer mais um país. Saí para a Argentina com um calor de quase 40 graus no Chaco com mais de 600 km de reta para cruzar o país até a cordilheira dos Andes, onde a viagem realmente começou. Tentei cruzar a pré-cordilheira por um caminho que era cortado por rios e não pude atravessar. Mudei os planos e segui para o Paso Sico.
Explorei o antigo passo Huytiquina, que foi abandonado há anos e não consegui passar uma montanha por falta de potência da Biz, que não conseguiu subir, mas as paisagens fizeram valer a pena a tentativa. Voltei para a ruta e em Toconao consegui comprar gasolina para chegar a San Pedro de Atacama. Segui para Calama de onde fui para Uyuni por Ollague. Passando Uyuni segui para a cordilheira Real e por estradas de mineiros. Cheguei a mais de 5.200 metros de altitude perto dos glaciares, rodando por cênicas estradinhas nas margens de precipícios de centenas de metros de altura. Foram 2 dias rodando a mais de 4.000 metros até La Paz e depois segui explorando a cordilheira ao norte até próximo a Copacabana, onde cruzei para o Peru.
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No Peru tentei chegar até a cidade mais alta do mundo, La Rinconada, mas a moto teve problemas e não pude seguir adiante. Desci para o litoral e segui para o Chile, de onde fui para a Bolívia pelo Paso Tambo Quemado para conhecer o Parque Nacional Sajama e depois rodar por 3 dias pelos desertos até Pisiga e voltar para o Chile para descer até o início da Carretera Austral e percorrer aquela estrada de ponta-a-ponta.
A Carretera Austral é uma das mais bonitas estradas da América do Sul, são mais de 800 km sem pavimento, mas de beleza sem igual com sua floresta com plantas gigantes, montanhas com glaciares e lagos cercados por fiordes que atraem todo tipo de viajantes.
De Villa O`higgins retornei rumo norte para entrar na Argentina e descer para Ushuaia. Muitas belezas naturais me aguardavam neste caminho. O primeiro lugar visitado foi El Chaltén, cidade que é o paraíso para quem curte treeking e abriga o Cerro Fitz Roy, que podemos ver a mais de 100 km e vai crescendo conforme nos aproximamos da pequena e acolhedora cidade. O próximo lugar a visitar foi o Glaciar Perito Moreno em El Calafate. Outro lugar de beleza ímpar, onde podemos apreciar sem pressa a grande massa de gelo atravessar o lago e aos poucos ir se partindo com som de trovão e cair nas geladas águas do lago.
Seguindo para o Sul adentrei novamente no Chile para conhecer o Parque Nacional Torres del Paine, com suas imponentes torres, cachoeiras e rios de águas azuis claras. É um dos lugares mais bonitos da América do Sul.
Cruzei para a Tierra del Fuego desde Punta Arenas e segui para Ushuaia, cidade mais austral do mundo, onde naveguei pelo estreito de Beagle para ver pinguins e muitos outros animais que vivem lá.
O retorno ao Brasil se fez pela Ruta 40 desde Punta Loyola até San Juan, passando por mais de 800 km de rípio.
A passagem pela patagônia argentina e chilena teve um preço, foram 18 pneus furados por diversos motivos, rendendo muitas histórias.
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Fiquei em casa 3 meses editando vídeos e resolvendo pendências para poder deixar o país para uma viagem planejada para durar mais de 3 anos e em 08 de julho de 2018 parti de Santa Catarina para Brasília onde participaria do Capital Moto Week, mas no caminho fui parando em várias cidades, tornando reais várias amizades virtuais e conhecendo novos lugares. Após Brasília segui para o Rio de Janeiro, passando por partes da Estrada Real e conhecendo várias cidades históricas de Minas Gerais até chegar a Paraty, onde passei o primeiro susto em um acampamento com um grande cachorro que ficou por meia hora latindo em volta da barraca no meio da madrugada. Por sorte não atacou e quando estava quase rouco ele foi embora, cansado de latir.
De Paraty segui rodando todo o litoral até São Luís, sempre procurando passar pelas estradas mais próximas das praias e muitas vezes pela areia. Fui recebido por muitas pessoas e conheci muitos lugares desconhecidos que eram mais bonitos que os lugares mais visitados pelos turistas convencionais.
De São Luís segui para a rodovia Transamazônica, onde passei 4 dias rodando e em duas das noites acampei no meio da floresta Amazônica. Foram perto de 1.000 km rodados em estradas de terra, mas como não era estação chuvosa foi tranquilo rodar nessa estrada. Os únicos problemas foram: a poeira, que me deixou cor de tijolo; um pneu furado; e um aro torto por uma pedra.
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A moto ficou em Porto Velho por um mês enquanto eu trabalhava em tours de moto pela Bolívia e depois segui para o Peru, Equador e Colômbia, sem fazer turismo.
No segundo dia no Peru acampei a 4.750 metros e durante a noite uma nevasca atingiu a montanha onde eu estava e passei metade da noite chutando a barraca para que a neve acumulada caísse. Pela manhã 10 cm de neve cobria toda a montanha e a temperatura era de -4 ºC. Dois dias depois, entre Cusco e Nazca, a noite chegou e sem possibilidade de camping no deserto e longe de hotéis, tive que acampar em um cemitério e pela manhã a temperatura era de -11 ºC dentro da barraca.
Um barulho apareceu no motor e em Lima pedi para abrir. Era a campana que estava com folga. Segui viagem assim mesmo e fui procurando pela peça pelo caminho, sem sucesso.
Um dia antes de cruzar a fronteira entre Equador e Colômbia acampei em um local onde retiravam terra e pedras a 20 km da fronteira e pela manhã, quando clareava, um barulho de carro chegando me acordou, fiquei acordado e ouvindo o barulho de alguém descarregando algo desse carro. Pensei que fosse lixo. Quando ouvi o carro ir embora eu sai da barraca para ver e se tratava de pacotes quadrados embalados, como as drogas que a gente vê quando são apreendidas pela polícia. Sabia que era bom sair logo dali e voltei para a barraca para começar a guardar minhas coisas e vazar rápido. Uma pessoa apareceu e começou a esconder as drogas no mato ao lado. Quando terminei de guardar minhas coisas a pessoa já tinha escondido as drogas e veio conversar comigo, como se o que ela tinha acabado de fazer fosse normal. Antes de eu partir pediu que não falasse nada do que vi. Foi uma situação muito tensa, onde eu poderia ter sido morto por pôr em risco a operação.
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Segui pelas tortuosas estradas da Colômbia até Bogotá, onde consegui a peça e fiz a troca. Decidi mandar a moto por barco saindo da cidade de Turbo para o Panamá ao invés de Bogotá por avião, para poder conhecer o mar do Caribe, além do que também era mais barato.
Foi uma decisão que para muitos, após saber do desfecho foi uma péssima ideia e já explico o porquê.
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No primeiro dia de viagem a moto foi em um barco de carga e eu em uma lancha que viajava a uns 60 km/h atravessando as ondas em uma viagem de quase 4 horas até Capurganá, que só foi legal porque sobrou um colete para eu sentar em cima, do contrário teriam sido 4 horas de pesadelo. Em Capurganá peguei outra lancha de 15 minutos para Sapzurro, onde chegava o barco com a moto no fim da tarde. O barco chegou, mas não desembarcaram a moto ficando para o dia seguinte. Desembarcaram já à noite e no dia seguinte eu tive que contratar uma lancha para levar a moto e eu até Puerto Obaldia. Seriam mais meia hora de travessia em uma pequena lancha que ia atravessando as ondas e a moto batendo para todos os lados. No caminho quebrou o manete do freio e ao desembarcar a moto na praia ela caiu no mar a uma profundidade de 50 cm de água, tombou e molhou todas as minhas coisas, exceto os materiais de camping e os eletrônicos, que eu tinha em uma bolsa estanque.
Recolhi tudo e fui até a polícia portuária para que revistassem a moto e depois fui procurar onde acampar até que chegasse o barco que me levasse para a primeira estrada no Panamá.
Em teoria era para ficar no máximo 2 dias na vila, mas passei 12 dias esperando um barco, 2 afundaram na semana anterior à minha chegada, que ocorreu no dia 24 de dezembro, então tinham mais os feriados para me atrapalhar. Pesquei todos os dias para diminuir os custos e depois de dois capitães voltarem atrás na palavra de me levar daquele lugar encontrei um com palavra e subi a moto no barco para navegar por 5 dias parando em cada ilha no caminho entre Puerto Obaldia e Cartí.
Foi pela experiência destes 5 dias que escolhi esta travessia, pois fomos parando nas ilhas de indígenas e pude ir conhecendo o lado negativo desta parte do Caribe, que é a total falta de respeito dos nativos para com o ambiente em que vivem. Apesar de morarem em um paraíso jogam todo o lixo no mar.
As paisagens são lindas olhando de longe, principalmente as ilhas desertas, porque as ilhas dos indígenas são terríveis.
Durante a viagem no barco pude pôr a moto para funcionar, pois após a queda no mar não ligava mais. Descobri que o problema era a vela.
Chegando a Cartí desci a moto em outra lancha que me levou para a praia e de lá pude pegar a estrada novamente e rodar até a cidade do Panamá.
A temida América Central, no que diz respeito a segurança e aduanas não foi nada daquilo que eu tinha lido ou assistido. As aduanas e imigrações tem taxas, seguros e burocracias, mas nada daquele tormento reportado por outros viajantes e quanto à segurança eu me senti como rodando pela América do Sul, não dá para baixar a guarda igual, mas nada que representasse real perigo.
As paisagens são um caso à parte: vários vulcões, inclusive se pode chegar até a cratera de um para olhar a lava lá dentro; muitas praias pelo lado do Pacífico, mas nenhuma mais bonita que as do Caribe ou as do Brasil; visitei várias ruínas dos maias; e até nadei com tubarões em Belize, um país onde a maioria da população é negra e fala inglês.
A América do Norte começou em Chetumal no México e foi ali que a Biz entregou os pontos. Um barulho que vinha aumentando me fez parar e abrir o motor para ver o que era. Resultado: Rolamento do virabrequim, biela e bomba de óleo danificados, mas eles não trocavam apenas a biela, sendo necessário trocar o conjunto do virabrequim todo e não tinham as peças no México. Pedi do Brasil, mas quando elas chegaram ao México descobri que a burocracia torna impossível sacar as peças sozinho e no tempo hábil para que o bem não seja considerado como abandonado. T teria que contratar um despachante aduaneiro por meros 500 dólares, mais impostos, estadia, etc. Resultado: Mandei as peças de volta, comprei uma Honda Wave 110 cc, passei o baú para ela, guardei a Biz em Chetumal para um posterior resgate e segui minha viagem.
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Como perdi um mês entre tentar consertar a Biz comprar e preparar a Wave para seguir viagem, tive que cortar o turismo do México e subi para os EUA pela rota mais curta e vendo apenas o que tinha de atrações turísticas nela. Mesmo assim pude visitar muitos locais legais, sejam de origem humana ou da natureza. No México provei vários tipos de comida, sempre muito gostosas e baratas e também conheci melhor o povo daquele grande país e provei da irmandade motociclística.
Entrei nos EUA por San Diego e de cara o primeiro desafio foi conseguir andar fora das freeways, o que foi um tormento, pois as cidades eram gigantes e sem poder passar pelas freeways eu era obrigado a andar pelo trânsito urbano. Para percorrer 70 km era preciso 2 horas. Tive que, em algumas oportunidades, entrar nas freeways e é perigoso para uma moto que não passa de 90km/h, pois o trânsito está sempre acima de 110 km/h. Na Califórnia somente motos acima de 150 cc eram permitidas nas freeways.
Em Los Angeles fui a vários lugares utilizados em filmes, na calçada da fama e no píer de Santa Monica, onde a rota 66 termina. Tudo na cidade lembra filmes.
O próximo passo era chegar a San Francisco pela Route 1, eleita uma das mais bonitas do mundo, mas para isso novamente eu tinha que andar muito pelas cidades e também na freeway, até chegar ao ponto onde a Route 1 se torna uma rodovia simples e não seria proibido para mim percorrê-la. A estrada faz jus à fama. Ela segue pela costa a maior parte do tempo cortando a montanha que termina no mar e tem várias pontes muito bonitas.
Na Califórnia passei também pelos parques nacionais de Yosemite, Sequóias e Death Valley. São parque com belezas distintas e sem igual. Em Las Vegas andei pela noite e pude ver o que seria Sodoma e Gomorra se ainda existissem. É a cidade do pecado, mas com tanta coisa bonita para se ver que fica impossível deixar a cidade sem ter a vontade de voltar lá mais uma vez.
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No Grand Canion pude ter uma noção do quanto somos pequenos frente a essas belezas. O cânion chega a ter 1.800 metros de profundidade e até 29 km de largura. É impressionante! Igualmente impressionante é o Monument Valley, usado muito como pano de fundo para os filmes de faroeste e no desenho do Papa Léguas. Foram horas andando por lá, me sentindo nos filmes que tinha assistido.
Em Moab, Utah, pude andar por muitas estradas péssimas com vistas de tirar o fôlego, por vales e montanhas como as que tem no Grand Canion, inclusive acampar em meio a tudo isso foi um dos pontos altos da viagem.
O último parque a ser visitado foi Yelowstone com seus magníficos gêiseres e muitos animais andando pelo parque. Foi lá que vi o primeiro urso, bisões e alguns veados.
Segui para o Canadá e no segundo dia estava passando pelos parques Jasper e Banff, que estão sobre as montanhas rochosas e a estrada sempre está ao lado de montanhas nevadas, glaciares, rios e lagos de águas azuis. Daqui para a frente os acampamentos foram mais tensos por conta dos ursos, cada vez mais numerosos, me obrigando a tomar certas precauções para diminuir os riscos de ataques. Estas precauções me levariam a não ter problemas com ursos até Vancouver na volta, de onde escrevo este relato agora.
Dos parques para o norte a paisagem não muda e a viagem torna-se monótona, apenas rodar. A paisagem é sempre a mesma: florestas de coníferas, pequenos rios, lagos e pequenas cidades a cada 150 km. A única coisa que salvou o trajeto era ficar contando ursos na beira da estrada. Passaram de 30 que eu vi, fora vários alces, elk, cabras das montanhas e outros bichos. A fauna no Canadá é abundante e variada.
Rodei a Alaska Highway de ponta a ponta, passando pela floresta de placas em Watson Lake e terminando em Fairbanks, onde parti para a Dalton Highway, conhecida como uma das mais perigosas do mundo no inverno. São 800 km entre Fairbanks e Prudhoe Bay e destes quase a metade é de chão, mas que devido a não ter chuvas estava quase tão boa de rodar como o asfalto um tanto deteriorado que tem nesta parte do mundo. Mas não saiu barato alcançar a cidade mais ao norte do continente Americano. Foram 4 pneus furados sendo que andei 60 km com pneu furado para voltar a Prudhoe Bay e poder continuar a viagem com um pneu sem câmara que eu tinha.
No Alaska foram quase 5.000 km e nenhum urso avistado. O que vi foram muitas belezas em lugares distintos, pois rodei quase todas as principais estradas do Alaska. Visitei Valdez, Homer, McCarti e Kennecot.
A volta para o Canadá se deu pela fronteira ao norte, pela Top of the World Highway, estrada que não é pavimentada e passa pelo topo de vários cerros e termina em Dalton City, uma bela cidade que surgiu com a corrida do ouro no início do século passado e preserva muitas das antigas luxuosas casas da época.
Para voltar aos EUA escolhi uma rodovia diferente, a Route 37, Cassiar Highway, que passa por vários lagos de água transparente e potável. A estrada passa por entre montanhas e sempre com belas paisagens. A próxima atração a ser visitada foi o Glaciar Salmon, que é gigante e tem um mirante onde se pode ver toda a sua extensão. Acampei em uma antiga estrada de mina de frente para o glaciar e para minha sorte tinha lenha cortada pronta para ser queimada. Foi um dos melhores campings até agora.
Seguindo para o sul voltei a passar pelos parques Jasper e Banff, porque quando subi o tempo não estava muito bom. Desta vez pude ver melhor o que já tinha achado muito bonita antes.
O próximo destino foi Chilliwack, onde estou agora, mas a viagem segue e fica o convite para vocês seguirem minhas redes sociais e principalmente o canal no Youtube onde tem vídeos diários sobre esta viagem.
Até aqui foram 84 mil km percorridos em 18 países durante 466 dias de viagem.
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