Eu ainda estava maravilhado com as paisagens daquele sábado: rios, lagos, cordilheira e picos nevados com a primeira neve do ano, vulcão e parques nacionais. Quando me dei conta, entre um e outro milésimo de segundo, a moto estava derrapando em direção ao guard-rail de concreto.
Quando percebi que a queda era inevitável, deitei ainda mais a moto e deixei que ela deslizasse na minha frente. Não sei se por milagre ou por um acaso da sorte, consegui colocar em pratica o que eu tinha aprendido durante muitos anos de Motociclismo e usei a técnica para cair em curva, evitando que a moto caísse em cima do meu corpo. Por sorte, quando eu realmente caí, já estava bem próximo da grama.
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A moto bateu num pilar de concreto e parou. Eu continuei deslizando e também bati com as costas num outro pilar de concreto. Naquele momento pensei no pior. Minha vista escureceu na hora e devido à pancada nas costa me faltou ar e num relance de preocupação me lembrei da minha família e como num pesadelo imaginei o trabalho que iria dar a eles se eu morresse ali tão longe de casa.
Passados alguns segundos, eu ainda meio grogue, despertei com um barulho de motor, foi quando me dei conta que aquele barulho vinha da minha moto que continuou ligada e acelerada, mesmo depois da queda. A falta de ar momentaneamente passou e no lugar veio uma dor nas costas. Eu pensei comigo: vou ficar aqui parado até chegar socorro.
Passaram-se alguns minutos e nada de aparecer alguém. Consegui levantar uma mão, levantei a outra, percebi que apesar de doloridas só tinha um pequeno arranhão na mão esquerda, continuei ali deitado, imaginando o estado das minhas pernas, apesar de não sentir dor alguma nelas, pensei que elas estivessem destruídas, mas conforme eu ia me restabelecendo percebi que minhas pernas também estavam bem. Minhas preocupações se voltaram para minhas costelas. Elas sim, doíam muito. Continuei ali parado esperando ajuda. Eu tinha certeza que tinha quebrado algumas vértebras, principalmente por causa da falta de ar que sentia e também porque percebi quando bati minhas costas contra o pilar de concreto.
Passaram-se longos minutos e nada de ninguém chegar. Foi quando me lembrei que aquela Ruta estava dentro do Parque Nacional Lanin. Alem do mais, interditado em alguns trechos para manutenção. Não ia ser fácil passar alguém naquele horário para me socorrer e, já que não tinha acontecido nada com minhas mão e pernas, resolvi tentar me levantar, mesmo com medo de ter fraturado alguma costela ou pior ainda, a minha coluna.
Percebi que eu mesmo teria que me socorrer e tentar pedir ajuda, fui me levantando bem devagar e, como num milagre, consegui me sentar e constatar que nada de grave tinha acontecido comigo a não ser um grande calombo em baixo do cotovelo do braço direito e um arranhão profundo na mão esquerda. Ainda meio zonzo, consegui me levantar, tirei o capacete e fui desligar a moto que gritava muito alto, como se ela tivesse sentindo toda a dor que era para eu estar sentindo. Um silencio terrível invadiu a cordilheira e, num gesto do mais completo egoísmo da minha parte, comecei a sentir raiva por ter me colocado naquela situação.
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Ainda bem que nem deu muito tempo de sentir raiva. Foi quando passou por ali o primeiro carro, que parou imediatamente para saber o que tinha acontecido. Em instantes chegou mais dois carros e todos desceram para me auxiliar. Naquele momento eu já estava em pé, tentando recolher minhas coisas que estavam espalhadas pelo chão e, mesmo eu dizendo que estava tudo bem comigo, me fizeram deitar novamente e esperar socorro. Um deles tinha Radio PX no carro e entrou em contato com o guarda parques, que estava em treinamento no lago Faulkner, ali bem próximo de onde eu havia caído. Enquanto esperávamos a chegada do guarda parque, eles terminaram de juntar minhas coisas que espalharam-se na queda: documentos, maquinas fotográficas, celular, mapas e o pingüim meu mascote.
Levantaram a moto. Foi quando eu senti aquela dor com sabor de frustração. Me doeu muito, muito mesmo ver minha companheira com as duas bengalas entortadas, carenagem toda destruída, para-brisas quebrado, guidon amassado, protetores de mãos totalmente ralados, roda dianteira amassada.
Na verdade o que doeu foi perceber que ali naquele momento teria que adiar o meu sonho de cruzar a Carretera Austral.
Em menos de dez minutos o Guarda Parque chegou e, depois de uma consulta superficial, ele constatou que dava para me levar ate um ponto de apoio que ficava num camping próximo ao lago Falkner.
Com ajuda dos outros, colocaram a moto em cima da camionete dele. Ainda meio dolorido, agradeci como pude àqueles que pararam para me auxiliar e rumamos para o camping.
Leia no blog do Saulo, Moto e rutas uma Paixão como foi essa viagem de moto até ela ser prematuramente interrompida na Patagônia Argentina.
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