Viagem do Atlântico ao Pacífico

Dia 21 de abril, quinta-feira, início da viagem. O dia amanheceu bonito e a vontade de viajar de moto era grande. Saí de Tubarão, que fica no litoral do Oceano Atlântico, por volta das 07h30min e logo vi que muitas paradas me aguardavam, já que a autonomia da Sportster é pequena. Quando estava próximo à cidade de Butiá, o tempo foi fechando, o vento começou forte e peguei chuva por cerca de 200 km, mas, sem muito frio. A tocada foi boa e passei cedo por Alegrete, onde estava programando dormir, razão pela qual acabei esticando até Uruguaiana, acompanhado de um belo pôr do sol, chegando na cidade às 20h30min.

No segundo dia preparei a moto cedo, tomei café e parti. A passagem pela fronteira foi rápida. No primeiro trecho argentino a pista era boa e duplicada, com pouco movimento e poucos postos de gasolina. Por outro lado, na rota para Federal, a estrada era péssima e com muitos buracos. Fui parado no primeiro posto policial, que exigiram pagar uma “taxa” de 100 pesos. Acabei dando R$ 10,00 e me liberaram. Tive sorte, pois já havia lido sobre cobranças bem maiores neste trecho. Logo após, outro posto policial, porém, me enrolaram por aproximadamente 30 minutos e não cobraram nada. Depois de mais buracos e mais postos policiais, no final de tarde chego finalmente a um trecho bom, próximo a Córdoba. Assim, segui até Villa Maria, onde cheguei por volta das 19h, fechando 800 km rodados.

A expectativa era grande para ver a Cordilheira. Ao preparar a moto no sábado, vi que uma seta traseira estava caindo. Perdi um bom tempo, pois meu canivete não chegava facilmente até a peça. Com muito frio e chuva, saí por volta das 10h de Villa Maria. Passada a cidade de Rio Cuarto, o sol abriu e a estrada voltou a ficar em boas condições. Em Villa Mercedes a rota era ainda melhor, duplicada e com longas retas. Algumas montanhas surgiram no cenário, antes plano, e o verde dava lugar à vegetação seca. Ao passar por San Luis, comecei a avistar a Cordilheira dos Andes, que estava encoberta por nuvens. Cheguei a bela Mendoza próximo às 20h, ainda claro, onde recebi a notícia que a estrada até o Chile estava bloqueada por uma nevasca, muito incomum para a época.

No domingo, mesmo com o bloqueio, resolvi chegar mais próximo da Cordilheira dos Andes. A saída foi com temperatura próxima dos 7ºC e muita chuva. No início da subida, fiquei surpreso com a beleza do local, uma região com lagos cercados de montanhas. Parei diversas vezes para apreciar a paisagem e aquecer minha mão junto ao motor. O sol resolveu aparecer entre as nuvens, destacando ainda mais os túneis entre as rochas, curvas, rios e as montanhas.

Passei por Potrerillos e cheguei a Uspallata por volta de 12h. Fui informado que a rota abriria apenas na terça-feira, de modo que não daria tempo para eu completar a viagem. Mas por lá permaneci com esperança. Achei um hotel afastado, simples, com uma vista incrível. Conheci um senhor, com o qual conversei até tarde, junto de sua esposa, além da senhora que cuidava do hotel e o dono.

Ainda sabendo que não iria rodar, acordei no domingo às 06h30min. Para minha surpresa, estava nevando. Às 12h00min, mais uma surpresa: a rota havia sido liberada. Não pensei muito, arrumei minhas coisas e parti. A emoção foi forte. O clima fechado e a neve caindo acrescentava mais drama. As mãos congeladas eu mantinha no motor, já que as duas luvas não eram suficientes para os -6ºC. A sensação térmica era ainda pior, mas estava impressionado com o espetáculo que a natureza proporcionava. Quanto mais avançava, maior eram as montanhas e a beleza do local. O sol não aparecia, apenas neve. A presença de vários caminhões me tranquilizava, acreditando que poderia contar com eles caso necessário. Passei pela fronteira do Chile – bastante crítica – e encontrei as únicas quatro motos que vi durante o percurso. Ao descer o grande caracol, senti que havia de fato realizado o sonho que estava em busca desde a saída de casa. Resolvi não dormir em Santiago e segui para Viña del Mar, no litoral do Oceano Pacífico. O pôr do sol me acompanhou, como de costume, até chegar finalmente à costa do Pacífico. Este foi, sem dúvidas, o dia mais memorável da viagem.

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Com sentimento de dever cumprido, acordei na terça-feira sem saber o que fazer – se já retornava ou ficava para me recuperar. Resolvi me preparar para voltar até Los Andes, e lá, decidiria. Como o dia estava aberto, toquei direto. Parei no último posto de gasolina antes da Cordilheira e lá encontrei um brasileiro, Paulo, com sua GS650. Ele estava vindo do Atacama, viramos amigos rapidamente e acabamos tocando juntos. O cenário era totalmente diferente da primeira vez. O sol se fez presente e desta vez foi possível realizar mais paradas. Seguimos juntos até Mendoza, onde chegamos por volta das 21h.

Mais um dia de retorno e o frio continuava. A princípio, o Paulo iria junto até Villa Maria, mas resolveu ficar por lá. Saí de Mendoza às 10h, com tempo bom e toquei num ritmo legal. Abasteci em San Luis e segui por mais uns 100 km, quando um policial me parou. Me perguntei qual seria o problema. Ele me perguntou se eu tinha cartão de crédito e explicou que uma pessoa de moto havia esquecido em um posto de gasolina. Logicamente, era eu, rs. Tive que andar 20 km à frente para abastecer e depois voltar. No posto encontrei um grupo de brasileiros e com eles segui até Villa Maria, onde chegaria à noite, por volta da 19h.

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Na quinta-feira a bateria estava fraca e a moto não ligou. Provavelmente, por uma tomada USB instalada que havia quebrado. Levei a moto a pé até uma oficina próxima e acabei ficando na cidade para descansar, enquanto ela também recarregava. Peguei-a à noite, quando o amigo Paulo chegou à cidade.

No dia seguinte rodamos juntos novamente. O objetivo seria ir para Uruguaiana, mas como na estrada para Federal havia muitos problemas, recebemos a sugestão de ir pelo Uruguai, e assim fizemos. Seguimos por uma bela rota paralela à autopista, em meio à pequenas cidades, até chegarmos a Rosário, quando então, a estrada foi cercada de áreas alagadas, por onde seguimos com cautela por haver diversos animais na pista. Entramos no Uruguai e chegamos a Paysandú por volta das 17h.

Chegou sábado e o dia prometia. 1200 km separavam Paysandú de Tubarão. Seguimos para Rivera, passando por Tacuarembó. Porém, esta rota estava igual ou pior que a de Federal. Depois de 120 km percebemos também que não havia posto de gasolina. Achamos um vilarejo onde compramos nafta em uma casa. Continuamos rumo a Rivera, onde fizemos os procedimentos para saída do Uruguai e seguimos para São Luis, já no Brasil, até que encerramos a tocada juntos, já que ele iria pela serra e eu para o litoral. Parei cerca de 18h30min em um posto, pois não estava conseguindo enxergar com a viseira fumê e o frio. Faltavam ainda cerca de 220 km para Porto Alegre e 550 km para Tubarão. Quase dormi por lá, mas resolvi continuar. Encontrei um carro que ajudou com a iluminação e o acompanhei até chegar a Porto Alegre. Pensei que seria mais fácil vencer o próximo trecho que era duplicado e melhor sinalizado. E assim foi feito! Com tempo bom e pouco vento, fui curtindo a viagem, pensando em tudo que havia vivido nestes 10 dias e a vontade de estar em casa aumentando. Finalmente, aproximadamente 1h da manhã e 5900 km rodados, cheguei à minha casa!


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