Este é o relato de minha viagem ao redor da América do Sul com uma Ténéré 250cc, em janeiro e fevereiro de 2012, quando percorri 25.500 km em 54 dias. Saí do Brasil por Uruguaiana, atravessei toda a Argentina para chegar em Ushuaia, conhecida como TIERRA DEL FUEGO e também como O FIM DO MUNDO.
Depois fui para o Chile, sempre pela costa do Pacífico e, ainda pela costa, atravessei o Peru e Equador. Já na Colômbia e a Venezuela passei mais pelo centro, saindo por Santa Helena Del Uairen e entrando no Brasil por Pacaraima, em Roraima.
Nesta viagem tive o prazer da companhia de dois companheiros de São Paulo com duas XRE 300, Leandro e Lucas. Fomos juntos de Uruguaiana para Ushuaia e depois até Santiago, quando dali eles voltaram para São Paulo e eu segui meu roteiro rumo ao norte da América, do Sul.
Porque a Ténéré 250?
Eu já sabia que aTénéré tem um motor comprovadamente muito resistente. Com um tanque de 16 litros e através de várias pesquisas, cheguei à conclusão que era a moto ideal. Vi também que a Lander e a Fazer estão sendo vendidas em todos os países da América do Sul que ia passar e como a Ténéré usa a mesma mecânica, decidi optar por ela. E realmente há nestes países tudo para estas motos. Sabia que tinha um motor mais fraco que uma XT 660, mas com autonomia bem maior e o custo de manutenção menor.
E a moto não me decepcionou. Já havia rodado 11.450 km aqui na cidade, troquei o óleo com filtro e pastilhas de trás e saí para a viagem levando 30 kg de bagagem mais 90 de piloto.
Manutenção da moto durante a viagem
- Fiz nesta viagem 25.500 kms andando entre 90 e 100 kms/h.
- Regulei válvulas duas vezes, uma no norte da Argentina e outra no Equador.
- Usei sempre a gasolina mais barata dos países que passei.
- Usei óleo de motor Motul, Yamalube e também Mobil, todos 20w50, sempre trocando a cada 2.000 kms, o filtro com duas trocas não em uma. Em nenhum momento tive que completar o óleo.
- Troquei pastilhas de freio de trás.
- Troquei pneus trazeiro e dianteiro.
- Troquei a relação original por uma DID, que também já esta no fim.
- Furou o pneu dianteiro passando em frente da cidade de Cacoal em Rondonia, mas andei somente 300 metros até o borracheiro.
- Fiz um enchimento no banco com espuma melhorando a sua maciez.
- Achei que a bolha poderia ser um pouco maior, tive de andar agachado porque o vento patagônico ainda me castigava.
Estou muito contente e satisfeito por chegarmos inteiros, e também com o desempenho da Ténéré 250, que foi espetacular, tanto que dois dias após a chegada fui na Geração Motos em Florianópolis e troquei a Ténéré branca da viagem por uma zero km, agora azul.
Como me senti na viagem
Fui bem, não passei frio, calor sim, não tive problemas intestinais nem estomacais ou qualquer enfermidade. Comi bem, comi mal, dormi bem, dormi mal, mas tudo dentro do esperado. A saúde sempre esteve do meu lado e a alegria também.
Houve momento em que pensei em voltar. O cansaço te leva a pensar se o que está fazendo está correto, mas a vontade de fazer a América era tão grande que esta palavra não cabia no meu dicionário.
Mantive contato quase que diariamente com meus familiares, respondia aos e-mails de amigos e de quem me acompanhou pelo site do rastreador. Tive sorte porque quase não peguei chuvas, acho que 90% da viagem foi com sol. Medo só quando anoiteceu enquanto atravessava a Cordilheira dos Andes na Colômbia.
O mais desgastante são as passagens por aduanas, devido à burocracia de alguns países.
Um ítem que me fez falta foi o GPS, as rodovias cortam muitas cidades e você fica sem saber por qual rua vai seguir para sair da cidade e isto atrasa a viagem.
Os gastos com a viagem
Com alimentação, hospedagem e manutenção da moto foram de US$ 4.000, um padrão razoável, dormindo em hostal, alojamentos e pousadas e comendo em pequenos restaurantes e lanchonetes.
Nesta viagem percebi que temos duas Américas do Sul, uma com Brasil, Chile, Uruguai e Argentina e a outra com o restante, a primeira com países mais ricos, mais organizados, desenvolvidos e a segunda em desorganização, corrupção, burocracia, pobreza, mas todos com muita beleza.
Argentina
O nome surgiu devido a grande quantidade de prata encontrada na região pelos descobridores (em latim, prata quer dizer Argentum). Um país com uma cultura fantástica, vários escritores de renome mundial e também conhecida como terra do tango, localizada no sul da América do Sul, com uma área de 2,8 milhões de km2.
Minha passagem por este pais foi muito boa, mas as estradas não estão nas condições ideais; há falta de gasolina do centro ao sul do país; alguns policiais rodoviários corruptos, também faz-se muitas paradas para mostrar documentos, dá a impressão que policiais não confiam uns nos outros; a nafta, ou gasolina, no sul custa 2,00 reais e no resto do país a 3,00 reais; moto não paga pedágio; ainda existem 140 km de rípio na parte chilena, depois do Estreito de Magalhães.
A maior dificuldade em viajar para o sul da Argentina é devido às mudanças climáticas. O vento muito forte, principalmente entre Comodoro Rivadavia e o Estreito de Magalhães. Nesta ventania a Ténéré ficava para trás e as XRE levavam vantagem, eu pegava carona na traseira de caminhão para conseguir acompanha-los, mas achava que eles forçavam demais as suas motos. Inclusive o Leandro brincava comigo e perguntava: – o que é que a tenerezinha tem que não acompanha a gente? Tem 50cc a menos e eu tenho um caminho muito longo pela frente, por isso não posso forçar muito. Eu sentia que podíamos ter problemas por estar tocando 700 kms por dia com velocidade entre 110 e 120 e no vento 80 e 90 km/h. Para mim, acima do limite, visto que são motos consideradas pequenas. Isto fez com que as XRE tivessem problemas de queima de válvulas, tendo que fazer substituição em Santiago. A Ténéré teve que fazer regulagem de válvulas, devido ao grande esforço. Pensei que fosse quebrar, face o grande barulho.
O frio em janeiro é menos intenso, porem é preciso levar roupas apropriadas, porque se pegar chuva pode congelar e o tempo muda muito rápido. Durante o dia a temperatura é alta lá no sul, mas se o sol sair ou chover o bicho pega.
Na Argentina há muitos lugares bonitos pra se visitar, porém tudo é pago e caro. A comida e hospedagem são caros e com poucas opções, uma hospedagem mais barata custa 100 ou 150 pesos de 50 a 75 reais, um almoço 50 pesos ou 25 reais. Existe camping em quase todas as cidades.
O povo argentino é muito hospitaleiro principalmente com os brasileiros, só vê quem vai naquele país. Quem viajar pela Argentina vai encontrar hoje um país empobrecido em relação a anos atrás, quando Buenos Aires era considerada “a Paris da América do Sul”, e o povo tinha um padrão de vida de nível europeu.
Quem se aventurar ir a Ushuaia de moto, vá sem problemas, mas prepare-se: são 5.500km de Florianópolis (SC), muito vento e forte. Uma moto de 250 cc não passa dos 80 km/h.
Chile
Sua capital é Santiago. O nome Chile vem da língua dos índios Aimarás que chamavam de Chilli, que quer dizer onde acaba a terra. Está situado entre a cordilheira dos Andes e o Oceano Pacífico. É o país mais estreito do mundo, possui 4.300 kms de comprimento e a maior largura é 175 kms. Possui várias regiões importantes, como as geleiras no sul, o Deserto do Atacama. Também faz parte do Chile a Ilha de Pascoa no meio do Oceano Pacífico.
Este país está mais para primeiro mundo, um país organizado, com autopistas praticamente em todo o sul, porém toda padagiada, inclusive para motos, policiais honestos e educados, postos de gasolina muito limpos, casarões antigos feito hotéis, mas muito bem cuidados. Os chilenos são muito prestativos, o norte é mais desertico e com grandes distâncias, mas com boas estradas, sem pedágios, e o povo com bom padrão de vida. No Chile há muito o que visitar, principalmente no sul com seus vulcões, lagos, ilhas e a capital com seu mercado público.
Para quem não pretende fazer a Carretera Austral devido a dificuldade com o rípio, mas quer ver lindos lagos chilenos, entre por Comodoro Rivadavia, passe por Sarmiento e vá para El Bolson (ARG), depois siga para Osorno (CHI). Nesta travessia você verá lindos lagos verdes e azuis, muitos deles ao lado da rodovia, inclusive irá passar próximo ao vulcão Puyehue , aquele que jogou cinzas em Florianópolis, SC.
Foi o único país em que não precisei mostrar documentos para policiais nas estradas. No Chile você não se corre o risco de ficar sem gasolina nas estradas, sempre há a cada saída da cidade uma placa informando que a 5 kms há gasolina e na mesma placa informa que depois só a 170kms terá gasolina.
Peru
É uma palavra Inca que quer dizer na língua Quíchua (terra rica). Há no país três importantes regiões, a litorânea onde toda a costa é banhada pelo Oceano Pacífico, a segunda tem a Cordilheira dos Andes e a terceira a região Amazônica. O pais soma uma área de 1.285.215 km2, é o terceiro maior da América do Sul, a moeda é o NOVO SOL, a gasolina é vendida em galão de 4 litros, as principais cidades, além de Lima a capital com 6,5 milhões de hab, são Arequipa com 750 mil, Callao, na grande Lima, com 700 mil, Chiclayo com 700 mil, Trujillo com 680 mil.
Ao Perú eu chamo de país complicado, achei o pior país para se transitar, com muitas pequenas cidades próxima uma das outras, a velocidade é de 35 km/h e muito fiscalizada e os policiais são famosos por pedir propina, sempre com uma viatura policial no inicio e outra no fim da cidade. A Carretera Panamericana, que corta o país de norte a sul, está em péssimas condições, só está boa próximo aos pedágios (moto não paga). Em contrapartida é um país onde tudo é muito barato. No Perú também tem muito que visitar. Além de Lima, que é muito bonita, existem sítios arqueológicos por todo o país. No norte há praias famosas como Mancora, Punta Tombo, Punta Nero e muitas outras, no sul há grandes plantações nos vales em pleno deserto. O país é banhado pelo Pacífico de sul a norte, o povo é um pouco retraído, desconfiado, com estrangeiros, não aceitam ser fotografados ou filmados. Gasolina é encontrada em todo o país. Quem viajar ao Peru deve ter muito cuidado com as motonetas e motos de lá, eles não obedecem as leis de transito, furam sinal, não usam seta, andam na contramão, mas buzinam o tempo todo. Também chama a atenção o desinteresse com o meio ambiente, jogam tudo nas ruas, os ônibus e caminhões sem nenhum controle ambiental, é muita fumaça.
Equador
Do latim Aequus que significa igual. É no Equador que a terra é dividida em dois hemisférios, o país tem 283,5 km2, contando com o Arquipélago de Galápagos e fica no noroeste da América do Sul, sua capital é Quito.
O Equador tem um povo muito agradável, atencioso, boa comida e muito barato, a hospedagem também não é cara, gasolina custa 0,50 centavos de real por litro, usam o dólar como moeda. O pais é pequeno e tem boas estradas, para chegar a Quito tem que viajar entre a cordilheira dos Andes, assim como para atravessar para a Colombia. Quito é muito bonita, principalmente a parte antiga da cidade. Ao fazer a travessia do Equador para a Colombia você verá paisagens fascinantes, vale a pena conhecer o Equador.
Na aduana em Huaquilas, divisa com Perú, estão com um prédio novo e mais funcionários, o atendimento é bom e rápido. Em 2008 tive dificuldades para passar nesta aduana. Na parte plana do país você viaja sempre entre plantações de bananas e cacau, o povo é muito hospitaleiro e gosta demais dos brasileiros. Em Guayaquil fui a um tallers de moto (oficina), Moto Factory, indicado por um amigo e fui muito bem atendido por Carlos Coelho, Richard e Xavier que fizeram uma revisão preventiva em minha moto num sábado. A esposa do Carlos ainda me ofereceu um prato chamado fritada, comida típica do Equador. A eles os meus sinceros agradecimentos. O transito também é bagunçado, eu vi uma senhora lavando um tapete em cima da carretera Panamericana, ela colocou dois cones trancando uma pista e com uma mangueira lavava o tapete, isto encostado em um posto policial.
Colômbia
O nome vem do navegador Genovês Cristóvão Colombo, descobridor da América em 1492, abrindo caminho para a exploração e colonização. As principais cidades são: a capital Bogotá, depois vem Cali, Medelin, Barranquila, Cartagena e muitas outras lindas cidades.
É um país onde a maioria das cidades fica entre montanhas e de difícil travessia devido ao estado precário das estradas. Na Colombia você se irrita com as estradas. Quem pensar em atravessar a Colombia de moto não venha com rodas de liga. A travessia de uma cidade para outra é em torno de 400 km pela cordilheira, com muitos buracos. Se andar a 30km/h você não completa os 400, se andar rápido as rodas vão pro saco, mas fica maravilhado com o jeito acolhedor dos colombianos para com os brasileiros.
Um fato que me chamou a atenção foi a grande quantidade de soldados nas rodovias por todo o país, devido a problemas entre governo e as Farc. Quanto aos riscos da guerrilha, é mito, eles só querem personalidades que gerem uma boa troca e as estradas colombianas são muito bem controladas pelo exército. Numa das revistas extraviaram o documento da minha moto e eu não percebi, só fui sentir falta quando estava entrando na Venezuela e o que me salvou foi eu ter levado um documento antigo e cópia autenticada do documento atual colado na agenda. O custo de vida é baixo: um pneu 90-120-18 paguei 60 dólares. A comida se parece com a nossa, a cidade mais bonita e interessante é Cartagena. O povo não cuida do meio ambiente, o rio que corta Medellin recebe todo o esgoto da cidade, que desce para o Cabo Santa Marta passando por muitas pequenas cidades com um mau cheiro insuportável.
Venezuela
O nome vem do navegador Américo Vespúcio que, ao chegar, avistou casas em palafitas no lago Maracaibo e batizou-a de Venezuela. Situada no norte da América do Sul, tem área de 912.050 km2. A maior cidade é a capital Caracas. No norte faz parte do mar do Caribe onde possui 72 ilhas. A Isla Margarita é a maior e mais importante. A moeda é o Bolívar, as pricipais cidades, além de Caracas, são Maracaibo, Valencia e Barquisimeto.
Um que fator chama muito a atenção é em relação ao preço da gasolina que é 0,098 centavos de Bolivar. Eu colocava 10 litros e pagava 1 Bolivar que é como 0,50 centavos de real. As estradas são relativamente boas, principalmente as que ligam as maiores cidades com a capital que são autopistas. O pedágio foi extinto, inclusive para carros. No interior a população não paga energia elétrica, a alimentação e hospedagem são bem em conta, porém, a higiene deixa a desejar. A população costuma comer em barraquinhas (este costume também é praticado na Colombia, Equador e Perú). Talvez seja o motivo pelo qual o preço da alimentação seja tão baixo, isto leva também os pequenos restaurantes a praticarem baixos preços. Os cuidados com o meio ambiente são zero, apenas na Gran Sabana onde há um grande fluxo de turistas. Na aduana eu e seis turistas com veículos levamos 6:30 horas esperando a liberação para ingressar na Venezuela, é muita burocracia.
Brasil
Foi com muita alegria que pisei no Brasil, mesmo entrando numa região esquecida pelos governos, onde quase não há asfalto, principalmente de Roraima até Mato Grosso do Sul, mas só pelo fato de voltar a falar a nossa língua, saber que está em seu país e onde sabe quais são os seus direitos e deveres.
Mas falando em estradas não sei qual a pior, de Pacaraima a Boa Vista São 230 kms de pura adrenalina, quer dizer, mais terra que asfalto. Depois de Boa Vista a Manaus são 715 kms , 200 praticamente sem asfalto. De Manaus a Porto Velho no barco e de porto Velho a Rondonópolis no Mato Grosso foi um terror, cheguei a entortar a roda dianteira. Realmente só fica bom quando se entra no Paraná. Mesmo assim valeu o esforço que fiz nesta viagem, conheci muitas pessoas, fiz muitos amigos, apreciei as comidas, sucos e sorvetes típicos do norte do Brasil e destes países em que visitei, e para quem é do sul, o norte é um outro país, onde quase tudo é diferente, os costumes, a comida, as pessoas são mais calorosas, foram 5 noites numa balsa de Manaus a Porto Velho.
Faça você também a sua aventura, vá de moto, carro, bike, de bus, mas vá em frente, não importa a distância e sim a emoção. Toda viagem é gratificante, mesmo que pequena. No futuro você vai olhar as fotos e se sentir realizado.
- Ao metalúrgico Joninha, de São José(SC), que fez toda o suporte para o bagageiro e malas
- Cristóvão Anderson com o recheio do assento que facilitou muito as partes
- André Anderson da Auto Cargo com o rastreamento da moto
- Vanio Motos com manutenção e peças de reposição
- A todos os amigos que acompanharam via satélite do rastreador
- Ao Carlos Coelho, Richard e Xavier de Guayaqui no Equador
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