“Pensamos demasiadamente e sentimos muito pouco. Necessitamos mais de humildade que de máquinas. Mais de bondade e ternura que de inteligência. Sem isso, a vida se tornará violenta e tudo se perderá.” (Charles Chaplin).
Nesse 21º dia de viagem percorri 334 km com muita chuva e muito trânsito. Parecia que eu havia percorrido no mínimo o dobro de quilômetros. No total foram 8.837 km percorridos desde que iniciei a minha viagem de moto pela América do Sul.
Após uma volta a pé pelo centro de Assunção, voltei ao hotel para o checkout e, quando ia sair, já no estacionamento do hotel, o Francisco veio se apresentar. É um motociclista que integra o MC Cavaleiros Templários aqui do Paraguai. Eles fazem um dos maiores eventos motociclisticos daqui do Paraguai. Conversando com ele, me mostrou fotos no evento de Laguna-SC com sua Kawasaki ZX14, que agora foi trocada por uma BMW GS 1200 2015. Disse que a velocidade levou dois amigos e que por isso ele mudou de categoria de moto. Quando nos despedimos, ele comentou que o hotel era do sogro dele. Ai pensei porque o cara não me falou isso antes que eu pagasse a conta (risos). Ele me passou um cartão pessoal e disse que qualquer problema no Paraguai eu poderia aciona-lo. É a irmandade que o motociclismo proporciona e que não tem fronteiras, muito legal.
Parei em um posto Petrobras para abastecer. Talvez seja a maior rede de postos de Assunção. E o melhor é que a gasolina não é a brasileira, com 27% (ou mais) de etanol. Curioso que em todo posto da Petrobras vi também caixas eletrônicos do Itaú. Nesse posto tomei uma Fanta Guaraná (risos).
O trânsito de Assunção não chega a ser tão louco quanto o de Urcos no Peru e La Paz na Bolívia, mas exige cuidado. Os ônibus são velhos, normalmente caminhões adaptados soltando muita fumaça de diesel e andam muito rápidos.
Saí por uma via expressa da cidade. Começou uma chuva fina, e o trânsito estava bem carregado. Com o abastecimento que fiz não precisaria reabastecer, então a ideia era rodar sem parar até a fronteira com o Brasil.
Fazia calor, a temperatura estava a 26, graus mesmo com céu nublado. Eu já havia tirado no hotel todas as proteções térmicas das minhas roupas e também havia guardado na moto a capa de chuva, mas aquela chuva fina até que estava refrescante. Assim, enfrentando o trânsito e curtindo a chuva, após mais ou menos uma hora, consegui deixar Assunção.
A estrada era simples, mal conservada e com trânsito intenso. Muitos bi-trens trafegando e poucos pontos de ultrapassagem. Após alguns quilômetros a estrada passou a ser concessão (privatizada) e melhorou um pouco.
O céu à frente era negro e carregado. Olhando a estrada, via que ela ia direto em direção às nuvens mais negras. Parei a moto já com a chuva apertando para vestir a capa de chuva. Ao largo da estrada, flores amarelas nativas e plantações de milho e pastos a perder de vista.
Entrei na chuva e ela veio forte. Não dava trégua, pouca visibilidade e muito spray de água das carretas que passavam e que seguiam à minha frente. Ativei o modo de pilotagem segura e, curtindo um bom rock, fui pilotando de forma quase que automática, bem tranquilo mesmo.
Na medida que me aproximava da fronteira brasileira, ia relembrando algumas passagens dessa viagem, o pantanal e os muitos animais atropelados à beira da estrada, a Amazônia brasileira, as crateras na estrada entre Porto Velho e Rio Branco, a balsa sobre o Rio Madeira, a Amazônia peruana, a subida da cordilheira dos Andes a mais de 4.800m, as montanhas com neve ao meu lado na estrada, a energia de Machu Picchu, o lindo lago Titicaca, de águas azuis e os Uros, o teleférico de La Paz, o deserto de sal (Salar de Uyuni) impressionante, as milhares de lhamas pela estrada, paisagens fantásticas, os pivôs com neve, a neve à beira da estrada… Puxa, quantas coisas vi e vivi nesses pouco mais de 20 dias e vou levar pra sempre na minha memória. Meus pensamentos voavam longe. É muito para a agradecer ao Cara Lá de Cima por estar vivendo tudo isso.
A chuva persistia e a viagem não rendia. Andava a 80 km/h tomando muito spray de água. Anoiteceu e ainda faltava um pouco para chegar a Ciudad del Este, que faz fronteira com o Brasil em Foz do Iguaçu, e à ponte da amizade que liga os dois países.
Entrei em Foz do Iguaçu às 20 horas, após rápida passagem pela imigração Paraguaia. É bom estar no Brasil. Mesmo com tantos problemas é o nosso pais, é nossa casa, onde temos raízes. Você pode rodar todo o mundo, ver coisas fantásticas, mas ficará feliz ao chegar em casa.
No hotel, tive que lavar minha capa de chuva, as botas e a capa de chuva dos alforges. Era muito barro e sujeira de estrada devido à chuva.
Quando fui guardar a moto no estacionamento do hotel, um fato inusitado: haviam no estacionamento nada menos que 21 motos BMW alinhadas, a maioria GS1200 e algumas com placas do Chile, pensei: “- a capitão América faz jus estar aqui, tem no curriculum pelo menos 10.000 km pela América do Sul”. Alinhei a capitão América com elas e deixei lá (risos). Tirei uma foto para recordação, mas ela não ficou boa.
Deixe um comentário