Hoje pela manhã fui colocar a tralha na moto para pegar a estrada e encontrei com o Frank, o manobrista que hotel metido a besta chama de “Valet”, e ele me avisou que a moto dele está ao lado da minha. O cara veio com a Moto Guzzi 750 para me mostrar. A moto só precisa de uma pintura e uma boa limpeza. Ela está íntegra e funcionando “redondinha”.
O Frank, o Valet, arranjou uma vaga coberta para a Helô, o problema é que tinha que passar no meio de carros e entre eles tinha um com cara de mauzão. Este Camaro da segunda foto. Pedi a ele para chegar a viatura para a frente, passei com o maior cuidado, o carro é zero e o dono é um afro-descendente com mais de 2 m de atura.
Ontem à noite, analisei a rota de New Orleans para Pensacola e ví que o vigarista do GPS iria me mandar para a I-10. Uma enorme Highway, reta e cheia de caminhões. Sem a menor emoção, é o mesmo que beijar a própria irmã. Mas eu sou cheio de artimanhas e pus-me a examinar o atlas com um óculos que comprei por 1 dólar com 3 graus acima do meu, uma beleza. Ví uma estradinha, a 90, que atravessa a região do delta do Mississipi, passando por pântanos, manguezais, cruzando inúmeras pequenas pontes e seguindo pelo litoral. Não conversei, é por ela mesmo.
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No início foi um tanto complicado encontra-la, pois tinha jogo do Saints e a cidade estava fervendo de torcedores e carros, mas depois que peguei a estrada foi uma maravilha. Como falei, ela atravessa todo o trecho do delta com o Lake Borgne do lado direito (formado pelas aguas do Atlântico) e pelo Lake Pontchartrain à esquerda, formado pelas águas do Mississipi. Existem trechos com menos de 200 m de largura e as casas são construídas sobre umas espécies de palafitas, deixando espaço suficiente para as marés, que em algumas ocasiões, chegam a atravessar a estrada.
Tentei fazer fotos à esquerda e à direita da estrada para dar uma idéia do “environment” (não sei o que é isso, mas ouvi Hopalong Cassidy falando isso num filme e achei o máximo). Os pântanos me encagaçaram um pouco, pois dizem que tem aligator (uma espécie de lagartixa enorme). Por via das dúvidas, fiquei sempre por perto da Helô. Do outro lado da estrada, o direito, uma espécie de “banhado”, como o do Taim no Rio Grande do Sul.
O asfalto não preciso nem comentar, excelente embora a estrada seja de apenas uma pista na sua maior parte. Trânsito quase nenhum, pois é vedado a carros com mais de 4 toneladas devido às pontes. Além do mais, passa por uma infinidade de condados e municípios pequenos, da forma como eu gosto: paro no posto de gasolina para abastecer, bato um papo com o balconista ou com um outro viajante, com calma e, principalmente, tendo a consciência de que estou vivendo um momento especialíssimo, que compartilho mentalmente com todos vocês. Para mim, essa é a maior façanha da minha viagem: ter a consciência do que estou vivendo. Isto não tem preço.
Bay of Saint Louis
A primeira foto foi de uma das inúmeras pontes pelas quais passei. As pontes mais novas me chamaram a atenção por terem uma pista para bicicleta. Em toda a parte se vê uma preocupação muito grande em estimular o uso de bicicletas, principalmente nas “Scenics Parkway”, como eles chamam as estradas com um visual especialmente atraente. O melhor foi o visual, quando acabei de cruzar a ponte, dei de cara com uma baita avenida beirando o mar, costeando a Bay of Saint Louis, que faz parte do Golfo do Mexico. A areia é como a de Cabo Frio, branca e finíssima. O mar, pelo menos hoje, estava tão manso que parecia uma lagoa. Agora vejam, se eu vou viajar na I-10, no meio daquele monte de caminhões vomitando rolos de fumaça misturados com óleo diesel ! A Helô é muito chique para se misturar com aqueles bárbaros.
Como a hora do almoço já tinha passado há muitas luas, vi um monte de barcos de pesca de camarão numa marina e resolvi parar. Tinha um restaurante no alto de uma escadaria, lotado. Lembrei logo da Cabana do Pescador na praia das Conchas, “Jamil” para os iniciados. A bagunça lá dentro também era igual, apenas o idioma era um pouco diferente. Digo um pouco por que bêbado fala qualquer idioma, até mesmo Braile. O fato concreto é que eles estavam vendo um jogo (aquele que o cara corre e todo mundo pula em cima dele. Coisa besta) do Saints nas várias televisões espalhadas. É igualzinho a jogo de futebol, neguinho berra, faz comentário, dá soco na mesa, enfim, toda aquela fleuma da torcida do Flamengo e Corinthians juntas. Para não ficar deslocado, eu fingia que assistia e, quando os caras berravam, eu mandava lá um “- Uta que ariu !”, cada vez mais alto. Eu tava indo bem, molhava o camarão no molho creole, mastigava o infeliz e assistia aquele bando de barbados se agarrando e de vez em quando mandando meu recado. Foi um almoço interessante, principalmente depois que uma coroa queimadinha de praia sentou numa mesa a boreste da minha o que me estimulou a mudar o grito para “- Oxtozaaaaaa !”. E foi assim, de gritos em gritos, sem poder conter o riso (acho que ela ficou desconfiada) que curti um almoço da filial do Jamil em Bay of Saint Louis.
Sai do restaurante, mal rodei 2 milhas e dou de cara com “isso”. Um Reo, com chassis encurtado, pneus 16 x 20 parado na beira da praia. Pelo estado dos paralamas e do resto do carro que vocês não viram, mas eu ví, dá para saber que quem o usa tem 18 anos, cabelo parafinado, surfista e se chama Carlo, como o meu filho, pois era exatamente isso que ele fazia com meus jipes. Sei que já se passaram 25 anos, mas vendo esse Reo, me bateu uma vontade danada de dar-lhe umas porradas em homenagem aos velhos tempos
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Depois de deixar para trás essa monstruosidade e, sempre costeando o Golfo do México, proa na direção do Alabama e acelerador enroscado, pois tínhamos muito asfalto à frente para engolir…
Após rodarmos, quase que sem parar, eis que avistamos nosso objetivo: a divisa do Mississipi com o Alabama. Mais um estado registrado no livro de bordo da Helô, agora o Alabama, passagem obrigatória para alcançarmos a Flórida.
Embora fosse um trecho curto, decidi parar em Mobile onde, à margem da rodovia, existe um Battleship Memorial Park onde está o USS Alabama (60).
Falou em avião e museu, eu interrompo a viagem mesmo, principalmente se neste museu estão dois aviões com historias distintas, mas impressionantes. O primeiro é o Douglas DC-3, conhecido na FAB como C-47, sustentáculo do heróico CAN (Correio Aéreo Nacional), cujas histórias e façanhas são de conhecimento de pouquíssimas pessoas. Uma pena. O outro avião é um Mitchel B-25, bombardeiro médio que aplicou o mais surpreendente e ousado ataque sobre Tóquio na II Grande Guerra. Uma esquadrilha, liderada pelo Cel. Doolitle, foi lançada de porta-aviões próximo a aguas territoriais japonesas, já que nenhum avião americano, à época, tinha autonomia para atingir o Japão a partir de uma base em terra. Era uma missão sem retorno, pois os porta-aviões teriam que fugir rapidamente e os B-25 teriam que pousar na China. A missão, embora tenha sido um sucesso, não causou grandes danos materiais, mas foi um tremendo reforço no moral dos americanos e um grande abalo para os japoneses verem sua capital bombardeada.
No memorial em homenagem aos mortos no Vietnam, existe uma ala dedicada aos cães que morreram ou desapareceram em combate. Eles foram considerados soldados e tiveram as mesmas honras funebres que aqueles.
A primeira foto mostra uma lápide com as impressões das patas de um cão, bem como as das solas das botas de seu condutor. A segunda foto é a representação de uma patrulha e a última mostra os nomes dos cães mortos e desaparecidos.
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Saindo do Battleship Memorial Park, com o sol começando a se pôr e uma temperatura mais civilizada, foi fácil chegar à divisa com a Flórida, o último estado registrado no livro de bordo da Helô nesta viagem.
Da divisa até Pensacola foi muito rápido, coisa de 30 ou 40 milhas e o ritual de sempre: McDonalds e sua rede WiFi, procurar e reservar hotel, colocar endereço no GPS e descobrir que o hotel está na mesma quadra do McDonalds. Amanhã, acordar cedo para visitar o Museu Aero Naval de Pensacola.
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