A Blue Ridge Parkway

Bristol (VA) – Mountain City (TN) – Asheville NC) – 14 de junho

Hoje pela manhã recebi um telefonema do chefe da oficina avisando que a Helô esta testada, lavada, com óleo trocado só esperando por mim. A Harley-Davidson mandou uma pick-up pegar-me por causa da bagagem.

Após morrer nuns dólares que farão um rombo na herança dos garotos, fui ver a doce criatura. Só de ligar o motor percebi a mudança, nada daquela chiadeira que parecia ferro com ferro e, além disso, a trepidação do motor caiu uns 90% – os coxins estavam muito prejudicados e foram trocados.

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Arrumei a bagagem na Helô e sai da Harley-Davidson por volta do meio dia. Fui até o centro da cidade, comi um bifão e fiz a digestão da maneira que mais gosto: pilotando a Helô. Caramba, parece outra moto, a impressão é que as válvulas estão abrindo e fechando completa e corretamente e parece que melhorou o desempenho da nobre parceira. Vou medir o consumo pois ela gastava mais do que amante argentina, uma base de 16 Km/l na estrada. Vamos ver agora.

Peguei a estrada e parti em direcao à “The Snake”, agora em sentido contrário. As reboladas de traseira práticamente desapareceram, o torque melhorou e ela subia e fazia curvas que era uma beleza. Claro que não me meti a gato mestre pois as ribanceiras são muito mais profundas do que as do Rabo do Dragão e o movimento, muito menor. O risco de você não ser visto sofrendo um acidente é enorme, além disso, na minha idade, colar ossos é um problema meio complicado.

Viagem de moto pelos Estados Unidos

Assim, bailando com garbo, elegância e juizo, subimos e descemos a primeira montanha (a mais fácil), cortamos o Shady Valley e chegamos ao principal marco da Snake, o tal de “The Country Store”. Seu proprietário é o David, um coroa gente boa que vive comendo enormes sanduiches (ele prepara o seu enquanto come o dele, acho até que ele se engana algumas vezes e morde o do cliente). Quando ele soube que eu era brasileiro, me falou que quase não aparece gente do Brasil por lá e pediu que eu colocasse um marco (um alfinete com cabeça verde) num mapa meio esculhambado que ele tem para registro da origem dos visitantes. Mas faz parte do ritual, afinal o kit coxinha tem que ficar completo.

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Blue Ridge Parkway – estrada feita para motociclistas

Após concluir a “The Snake”, atravessando a segunda montanha e chegando a Mountain City (TN) resolvi procurar a Blue Ridge Parkway e matar a saudade daquela que considero uma das mais lindas e perfeitas estradas para viagem de moto. Já percorri essa estrada de cabo a rabo (cerca de 500 milhas) umas 4 ou 5 vezes, nos dois sentidos. Nunca vou me cansar de desfrutar da paisagem, do clima, do astral e, principalmente, de pilotar uma Harley-Davidson numa estrada que corre por cima de montanhas, onde o ar é mais puro, a temperatura amena, a flora exuberante e a presença do Criador uma constante.

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Consegui pegar a Blue Ridge em Blowing Rock (NC). Engraçado que quando tive que passar pelo meio da cidade um carro emparelhou com a Helô no sinal, dentro um casal com um garotinho. A moça, que dirigia, olhou para mim e fez sinal de positivo. Achei até que não era comigo, então ela baixou o vidro e gritou: “- Brasil !” e me mandou um beijinho. Muito legal.

Peguei a Blue Ridge e comecei a curtir as curvas que se sucedem em todo o percurso. A sinalização é excelente, mas você tem que tomar cuidado para não se distrair com a paisagem. Como a estrada corre pelo alto das montanhas Appalachian, tem momentos que você descortina vistas cinematográficas. Nesses casos sugiro parar nos locais apropriados para isso, já que a estrada não tem acostamento e é de mão dupla. No meu caso, eu paro mesmo, faço fotos de todos os ângulos, afinal é uma oportunidade de ouro registrar momentos tão marcantes.

Viagem de moto pelos Estados Unidos

Eu ia assim, parando, rodando, cumprimentando e sendo cumprimentado pelos irmãos motociclistas que cruzavam comigo. Num determinado momento, vi um grupo de umas 10 motos iguais paradas num mirante. Se eu tivesse certeza de que eram gringos teria parado pois sempre me recebem muito bem, porém o risco de serem brasileiros existia e nesse caso prefiro passar batido pois as decepções que tive com brasileiros que se dizem motociclistas me levaram a ficar longe deles. Claro que existem exceções, como os dois que encontrei cruzando o Novo Mexico no ano passado, os gaúchos na JP Cycle e principalmente a turma do Comichão de Brasília que fui encontrar em Milwaukee e rodei 2.000 km adicionais só para estar com eles, mas essa é uma história que vou contar mais à frente. Paciência pois.

Impressionante como os gringos nos tratam bem e se colocam à disposição para qualquer eventualidade. Eles sabem que você esta sozinho e muito longe de casa, enquanto isso, conterrâneos seus, preferem que você fique distante do “grupinho” deles. Mas isso, apesar de me entristecer, não me afeta pois entendo que todos têm limites e honrar o “código da estrada” não é para qualquer um, tem que ser motociclista e não apenas se fantasiar como tal. Se um dia precisarem do tio Helio, estarei de pé e à ordem, seja quem for.

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Bem, deixemos de lado essas coisas ridículas e voltemos ao nosso assunto. Hoje, como em todos os fins de semana, a Blue Ridge estava com o trânsito intenso com as motos e trikes predominando, especialmente as custom. Difícil ver alguém rodando sozinho e a quantidade de pessoas de idade acima dos 70 pilotando é enorme.

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Muito comum também ver casais na casa dos 80 com uma Electra ou Goldwing puxando um reboquinho fazendo sua viagem de fim de semana. Esse respeito e valorização dos idosos faz parte da cultura americana. O idoso aqui não fica sentado em uma cadeira de balanço esperando sua hora, ele sai, se diverte, trabalha (e muito), se associa a grupos, pilota motos (muitos) e por ai vai. Dá gosto ver. Hoje, quando cheguei no The Country Store, tinham umas 10 motos paradas na frente e seus pilotos sentados na varanda (a maioria tomando cerveja). O mais novo deveria ter mais de 75 anos, a maioria gordões, uns dois com rabo de cavalo. Maneiríssimo, acho até que tinha dois dando um “tapinha” !

E foi assim, curtindo as curvas da Blue Ridge, cumprimentando irmãos motociclistas até a mão doer de tanto fazer o “wave”, que cheguei ao “exit” que me levaria ao meu hotel em Asheville (NC). Um dos piores e mais caros em que me hospedei. Bom para aprender a não confiar demais em fotos de site, mas eu estava muito cansado para procurar outro. Amanhã tem mais.

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