Quebrada de Humahuaca / Purmamarca / Maimará / Pucará de Tilcara
A estrada é um convite ao prazer da pilotagem, pavimento impecável, curvas aerodinâmicas nas incríveis serras e uma sucessão de paisagens de beleza impactante… Assim é a Ruta 9, que percorremos a partir da cidade de Salta naquela manhã de muita luz e um céu de profundo azul.
Os quilômetros eram engolidos avidamente, na tentativa de compensar as inúmeras paradas para fotos, cada uma mais imperdível que a anterior. A primeira parada ocorreu no início da monumental Quebrada de Humahuaca, um extenso vale que se estende por mais de 150 quilômetros acompanhando o curso do rio Grande, emoldurado por essa singular formação montanhosa. Suas lendárias trilhas são testemunhas de mais de 10.000 anos de história de várias tribos que povoaram a região, entre as quais os omaguacas, que o denominaram Humahuaca, cujo significado é “rio sagrado” na linguagem aborígene. A arte e cultura dessa e outras etnias que habitaram aquele vale, pode ser admirado nas feiras de artesanato que pudemos encontrar, logo mais adiante na localidade de Purmamarca.
A idéia era uma visita rápida, almoço em Purmamarca e seguir viagem para alcançarmos Susques até o final da tarde num percurso tranqüilo, pois inúmeras outras atrações estavam por vir ao longo da rodovia e não queríamos perder nada.
Logo na chegada a Purmamarca já fomos surpreendidos pela visão inusitada do Cerro Siete Colores, um verdadeiro cartão de visitas da região. É impossível passar por ali e não ter o rosto irresistivelmente voltado para essa maravilha natural, resultado de sedimentos marinhos, fluviais e lacustres acumulados ao longo dos séculos. É a marca registrada daquela localidade que tem presença obrigatória nas ilustrações turísticas da Argentina e principalmente no rico artesanato regional.
Conforme previsto, almoçamos no povoado, num simpático restaurante chamado Don Faustino, onde pudemos degustar um delicioso bife de lhama, entre outras iguarias da região. Uma decisão de alto risco, pois nem daria para imaginar as conseqüências de um eventual desarranjo intestinal para um grupo de motoqueiros com alguns milhares de quilômetros ainda pela frente. Felizmente, mais uma vez isso não passou de uma piadinha de certo componente do grupo, querendo estragar o apetite da turma.
Em Purmamarca percorremos ainda a movimentada feira de artesanato que funciona na pracinha central e entre outras coisas fotografamos sua secular igreja de Santa Rosa de Lima, datada de 1648, ostentando os tradicionais muros de adobe e um singular pórtico de quatro arcos. A povoação situa-se a 2.190 metros de altitude e tem nas suas construções do século XVII uma das principais atrações. A sua estratégica localização aliada às boas estradas da região, fazem dela uma parada obrigatória na rota para o Chile e Bolívia, notadamente para San Pedro do Atacama, um dos mais concorridos destinos turísticos de aventura da América do Sul.
Entre os incontáveis turistas e aventureiros que encontramos pelo povoado, nos chamou a atenção um grupo de argentinos que se dirigia à Venezuela numa camioneta aparentemente bem preparada para essa aventura denominada “Expedición Venezuela 2010”, exibindo a chancela da National Geographic Channel (sic).
Pucará de Tilcara
Foi totalmente ao acaso nossa visita ao sitio arqueológico de Tilcara… Entusiasmados com a seqüência de atrações turísticas naquele dia, acabamos pegos de surpresa quando não encontramos um posto de serviço sequer em Purmamarca, aliás, eles são muito raros nos pequenos povoados. O plano em seguir para Susques logo após o almoço caiu por terra, nosso combustível não daria para chegar até lá: então teríamos que retornar pela ruta 52 até o seu entroncamento com a ruta 9 e seguir por ela cerca de 30 quilômetros até Tilcara…Era nossa opção mais viável para abastecimento.
Logo nos primeiros quilômetros da nova rodovia, começamos a agradecer a Providência Divina pela mudança inesperada. A estrada com bom pavimento, ainda tinha um traçado incrível e cruzava paisagens espetaculares. Nem havíamos percebido que estávamos percorrendo um dos mais belos trechos da encantadora Quebrada de Humahuaca. Nesse pequeno trecho passamos pela histórica localidade de Maimará, uma pitoresca aldeia no coração da Quebrada de Humahuaca, a 2.400 metros de altitude, antigamente povoada pelas tribos maimarás e tilcaras. Mesmo ao longe foi impressionante a visão do conjunto de cerros denominado Paleta del Pintor, montanhas que alternam a coloração amarela, vermelha e branca. Mais adiante estava Tilcara, a capital arqueológica da província de Jujuy, que tinha o precioso líquido para nossas motos e ainda oferecia sua grande atração turística: a Pucará de Tilcara, um conjunto de ruínas indígenas com mais de 900 anos. Uma fortaleza erguida no ponto mais elevado do lugar, a mais de 2.450 metros de altitude, com uma estratégica visão do rio Grande e que domina o principal cruzamento dos dois caminhos seculares mais utilizados na quebrada.
Nossa prioridade era realmente abastecer as motos, porém foi consenso esticar um pouco mais nossa estada no povoado para conhecer o sitio arqueológico, que além da fortaleza e museu, agrega ainda o denominado Jardim Botânico de Altura, um extraordinário conjunto de canteiros onde habitam as mais importantes espécies vegetais andinas. A passagem por Tilcara também ficou marcada pelo encontro que tivemos com uma expedição de luxo, composta de nada menos que 15 motos top de linha e novíssimas… Eram na maioria BMW e algumas KTM, pilotadas pelos motoqueiros mais janotas que conhecemos, pareciam ter saído de um comercial de TV. Roupas e equipamentos, inclusive as viseiras impecavelmente limpas, algo inacreditável para quem viaja de moto tão longe. Uma explicação logo esclareceu o mistério: Motos e pilotos vieram de avião de Buenos Aires até Salta; menos uma equipada camionete de apoio, que veio rodando e além dos mecânicos, peças e pneus, trazia uma moto reserva na caçamba (simplesmente uma BMW 1150 semi nova).
O líder do grupo era dono de uma concessionária da marca em Buenos Aires e estava viajando até Machu Pichu com os amigos. O bate–papo até que foi animado, pelo menos o líder foi o mais simpático de todos e até nos convidou para almoçarmos com o grupo. Declinamos alegando nosso pouco tempo para chegarmos a Susques, mas na verdade o que mais nos preocupou foi o sorriso indisfarçável do dono do restaurante e a idéia de rachar uma conta astronômica certamente.
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